domingo, 28 de julho de 2013

Religião e jovens

A realização da Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, desde o dia 22 de Julho, nos leva a alguns questionamentos, como por exemplo: Qual a relação entre religiosidade, espiritualidade ou a sua ausência e qualidade de vida, especialmente, entre os jovens? Que dinâmica psíquica envolve o crer, como também, o não crer, durante o período da juventude? Experiências religiosas contribuem para a melhora da qualidade de vida das pessoas?
            Segundo Geraldo José de Paiva, professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, e Wellington Zangari, psicanalista e doutor em Psicologia pelo mesmo Instituto: “Tanto no ateu como no devoto agem os mesmos dinamismos inconscientes e conscientes. Em ambos os casos, necessariamente, à base de tudo, estão os desejos e carências infantis (alguns neuróticos, outros não). Dependendo do itinerário de maturação de cada indivíduo, os “desejos”, “ilusões” e “falhas” podem ou não ser psicologicamente superadas e integradas. Se assim é, ao ateísmo como à devoção devem ser aplicadas as mesmas regras hermenêuticas de análise e interpretação do comportamento” (A representação na religião: perspectivas psicológicas. São Paulo: Loyola, 2004, p. 281).
            Apesar do tema “fenômeno religioso” ter sido ignorado durante muito tempo pela psicologia, entretanto, na atualidade, o interesse em estudá-lo é cada vez mais intenso, e não somente pelas diferentes correntes religiosas.
            A juventude, segundo o psiquiatra criador da Teoria do Desenvolvimento Psicossocial na Psicologia, Erik Erikson (1902-1994), é o período no qual buscamos por compreender a nós mesmos e a uma identidade pessoal que nos garanta uma ampla convivência com os outros, processo que se dá em meio a muitos conflitos íntimos (O ciclo de vida completo. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998).
            Neste sentido, para muitos jovens: “A religião se consolida como uma das principais formas de organização grupal nos tempos atuais”, conforme a psicóloga e doutoranda em Psicologia Social pela USP, Camila Mendonça Torres (Religião e Psique: Psicologia Social: Estudos de Religião e Protestantismo. São Paulo: Reflexão, 2012, p. 189).
            Imersos numa realidade insensível ao Sagrado, muitos jovens têm na religião, um dos poucos caminhos de experimentá-lo; cercados num contexto sócio histórico, mediado pelo império do consumo, enxergam o Sagrado além dos limites dos “casulos” que a religião institucionalizada insiste preservar, sem, contudo, a devida percepção de que Dele estão vazios; rodeados pelo empirismo observável, que não indicam perspectivas dignas de esperança, muitos jovens não perdem as possibilidades de transformação espiritual, e experimentam uma vida mais profunda e atenta aos mistérios da existência, sem cair na armadilha da superficialidade estéril.

            Deus nasce da experiência subjetiva de cada um de nós, deriva Ele de causas externas ou internas, e se assim é, se as tradições religiosas se se fecharem à pluralidade da subjetividade humana, certamente serão rejeitadas por que perderam a plausibilidade por reificarem o Sagrado, confundindo o Inefável com o ícone, tornando-se representante do “poderoso” literalismo bíblico e/ou teológico. Porém, se devidamente respeitarem o empreendimento criativo atuante na subjetividade dos homens, as imagens fossilizadas pelas tradições religiosas podem se encher de nova sacralidade, e levar, não só aos jovens, a se reaproximar e receber a presença do divino.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

XXV Inter Quinta_Jung - Debate - Filme: Poder além da vida

Secretaria Municipal da Cultura e
Centro de Estudo’s Junguiano de Marília

Convidam:
XXV Inter Quinta_Jung – Debate

         Exibirá o filme: “Poder além da Vida”, seguido de debate.

Sinopse: Dan Millman é um talentoso ginasta com sonhos Olímpicos. Ele tem tudo: troféus, amigos, motos velozes, belas garotas e festas “animais”. Seu mundo vira de cabeça para baixo quando conhece Sócrates (Nick Nolte), um homem estranho e misterioso capaz de entrar em contato com novos mundos de força e compreensão. Após um grave acidente, Sócrates e a jovem Joy (Amy Smart) ajudam Dan a descobrir que ainda há muito a aprender, e muito mais para deixar para trás, antes de se tornar um “Guerreiro da Paz” e encontrar seu destino. Uma comovente história sobre o poder do espírito humano. Informações Técnicas

Título: Poder Além da Vida
 Ano de Lançamento: 2006                           Recomendação: 12 anos                                                                           Direção: Victor Salva
Duração: 120 minutos
País de Origem: EUA 
                                                                           Gênero: Drama




Data da Exibição: 25/07/2013
Horário: 20h00      
Local: Sala de Projeção Municipal, piso superior da Biblioteca Municipal. Entrada pela Av. Rio Branco.

Comentários:

Alessandra Faria Rossi

Atuação: Clínica e Seminários (Instituto Teológico Rainha dos Apóstolos, Seminário Provincial Sagrado Coração de Jesus, Seminário Diocesano S. Pio X de Marília e Seminário Diocesano de Lins Nossa Sra. da Salette) Pós -Graduação em Counseling.

O nosso lado “Mula-sem-cabeça”

Conforme Carl Gustav Jung (1875-1961): “Todo grego do período clássico trazia em si um pouco de Édipo, assim como todo alemão tem em si um pouco de Fausto” (Símbolos da transformação. Petrópolis: Vozes, 1989, p. 28).
Partindo deste conceito, a psicóloga analítica Dulce Helena Rizzardo Briza, em seu “A mutilação da alma brasileira: um estudo arquetípico” (São Paulo: Vetor, 2006), nos leva a refletir quanto às figuras internas que constituem a psique nacional. Segundo Briza, inconscientemente compartilhamos de uma marca presente em nossos mitos – Saci Pererê, Curupira e Mula-sem-Cabeça – uma grande deformação.
Dado às deformações – menino de uma perna só, anão com os pés virados para trás e uma mulher que se transforma em muar acéfala e cospe fogo pelo pescoço – parece que acordamos de um tenebroso pesadelo, tomando como referência que o “Gigante” acordou. E, porque os pesadelos nos impressionam, podem ser chamados de “grandes sonhos”, isto é, preparam-nos para profundas alterações no curso da vida.
Conforme a psicologia analítica, as imagens oníricas são símbolos de nós mesmos, quer dizer, são personaficações de aspectos pessoais, que não são nem negativos nem positivos, mas representam, na realidade, quem somos e não aquilo que gostaríamos, os quais, para assimilá-los, precisamos explorar e colaborar da maneira mais total e ampla possível, e não apenas, intelectualmente.
Os protestos de rua contra as falhas dos gestores públicos e políticos em setores essenciais como a educação, a saúde, o transporte, a moralidade pública sinalizam que precisamos assimilar à consciência nossas deformantes fraquezas pessoais e nacionais, se quisermos dar um melhor rumo à nossa vida.
Todos nós trazemos um pouco da Mula-sem-cabeça dentro de nós. Exemplos de como agirmos inescrupulosamente, infelizmente, não faltam. Um deles, o jornalista Luciano Martins Costa, do Observatório da Imprensa, aponta: “A Polícia Federal está investigando a informação surgida nas redes sociais digitais, indicando que um grande número de médicos estaria fazendo a inscrição para depois promover uma desistência em massa e, com isso, desmoralizar a iniciativa do governo” (http://www.observatoriodaimprensa.com.br/radios/view/gt_gt_o_verdadeiro_nome_do_jogo_lt_br_gt_gt_gt_quem_resiste_a_reforma). E, os casos de vandalismo nas ruas dão conta das forças inconscientes subjetivas, individuais e coletivas que nos subjugam, afora os gestos dos governantes quanto ao trato da coisa pública, como voos com os aviões da FAB e o jantar de R$28.400,00, que Henrique Alves, presidente da Câmara dos Deputados, ofereceu a 80 peemedebistas, no último dia 16 de Julho.

Conforme Briza: “Precisamos resgatar a força da cabeça e da consciência (a cabeça da Mula) se partirmos do pressuposto que essa Mula esteja simbolizando a inversão do sexo, do instinto, dos valores materiais, que sobrepujam e dominam o espírito. Assim, a busca de questões materiais supera a das questões espirituais. Isso desencadeia uma desarmonização do espírito e uma perda da predominância da alma. [...] A jumenta, ou mula, significa a verdadeira humildade, a simplicidade, a paciência e a coragem, qualidade dos sábios, que têm cabeça e consciência. Se a Mula-sem-Cabeça arrancou nossos olhos, partindo do pressuposto de que, como a visão nos ajuda a tomar consciência, a enxergar a realidade, a examinar novas direções, a nos orientar, aí está expressa nossa inconsciência” (São Paulo: Vetor, 2006, pp. 143-144).

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Vivendo como Curupira

         A formação do povo brasileiro tem a marca da mutilação verificada em nossa mitologia - Saci, Curupira e Mula-sem-cabeça - conforme a psicóloga analítica Dulce Helena Rizzardo Briza (A mutilação da alma brasileira: um estudo arquetípico. São Paulo: Vetor, 2006).
            Temos considerado tais mitos como imagens presentes em nossos sonhos, durante o tempo em que adormecíamos, como o Gigante “deitado em berço esplêndido”. Figuras teogônicas do imaginário, reinantes nas florestas, lembradas de norte a sul do País, e narradas oral e literariamente não só por autores nacionais, como também, estrangeiros.
O que nos interessa é que não inventamos mitos, mas os experimentamos diariamente na lida diária como nação brasileira. Não se trata de uma imagem pessoal, de alguém ou de algumas pessoas especificamente, mas que nos expressamos psiquicamente, como eles são descritos, coletivamente. Nossa vida psíquica é dominada por estes mitos, aqui expostos devido à mutilação comum a eles, e por isso, reativam fatores em nossas almas, em sua maioria, inconscientes, que interferem na construção de um País melhor. Contudo, algo importante devemos refletir: temos de aproveitar os acontecimentos que resultam de nossa inconsciência e que impedem avançarmos numa agenda mais positiva, para que os transformemos em experiências que ampliem nossa consciência pessoal e coletiva, facultando a descoberta de novas possibilidades no enfrentamento dos mesmos.
Conforme Samuels: “Contos míticos ilustram o que acontece quando um arquétipo tem a rédea livre e não existe intervenção consciente da parte do homem. Contrastando com isso, a individualidade consiste no confronto e diálogo com tais poderes fatídicos, reconhecendo sua força primeva, mas sem submissão a ela” (Dicionário crítico de análise junguiana. Rio de Janeiro: Imago, 1988, p. 128).
            Quanto ao Curupira: “As tradições representam-no como um pequeno tapuia com os pés virados pra trás, e sem os orifícios necessários para as secreções indispensáveis à vida” (O Selvagem, Couto de Magalhães, 1876, pp. 138-139, citado por L. C. Cascudo, Geografia dos mitos brasileiros. Rio de Janeiro: José Olympio, 1947, p. 120).
            Segundo Briza: “Aqui nos deparamos com o andar que dissimula, desorienta, que também pode ser entendido como mecanismo de defesa” (A mutilação..., p. 127).
Precisamos reconhecer, que temos nos revelado hábeis criadores de disfarces em muitas questões da vida nacional. São muitas as provas que o Curupira está vivo, porque o vivemos em nossos lares, nas ruas, no trabalho, nas arenas políticas, sociais, culturais, econômicas e espirituais sem uma “intervenção consciente”, mas descarada e “submissamente”.
Não é possível esconder por muito tempo, sem que as consequências apareçam, um contexto marcado por artifícios montados, pois, fatos ou pessoas trazem à tona seja pela conduta ou por comportamentos não-verbais o que se tentam esconder.

Atenção governantes: os cidadãos não aguentam mais dados sociais e econômicos mascarados, discursos que não correspondem às duras e cruas realidades das ruas, blefes políticos e políticos blefes, compromissos ocultos. Antes, queremos: transparência já, clareza nas opiniões e posições, desmascaramento das articulações, etc.

domingo, 7 de julho de 2013

O Saci está solto. Recolham o Saci.

            Todos nós estamos engajados numa campanha “revolucionária”, como querem alguns, mas acima de tudo, emancipatória dos políticos que não queriam ouvir, que gritávamos por melhorias nas condições de vida do País. “A gente não quer só comida / A gente quer saída / Para qualquer parte...” – já cantávamos com os Titãs. E, queremos acreditar que não nos deixaremos calar, antes, instigados, encontraremos “saídas”.
As “saídas” precisam ser construídas, não estão prontas. Os códigos legais, tão-somente sinalizam-nos as ferramentas que precisam ser utilizadas.
Buscamos “saídas” de nossas limitações históricas, pois, não podemos mais aguardar por projetos messiânicos, mas de maneira madura, encontrarmos formas saudáveis de enfrentarmos as próprias limitações.
Temos de ter paciência com as contradições nesse processo, refiro-me às práticas violentas e criminosas por parte de alguns manifestantes nas ruas, às manipulações viciadas dos partidos políticos que querem tirar algum proveito eleitoreiro, mas precisamos, perseverantemente, continuá-lo. Lembremo-nos: as contradições são parte do processo, que precisam ser assimiladas à consciência, sem reprimi-las, porque não são empecilhos insuperáveis.
Desde que o “gigante acordou”, tem de enfrentar o desafio à sua evolução em maturidade. “Quando retomamos nosso mito heroico, resgatamos nossa coragem e retomamos nossa razão de viver e de enfrentar os desafios da vida, não só como pessoas, mas também como nação”, conforme Dulce Helena Rizzardo Briza, psicóloga analítica, presidente do Instituto Junguiano de São Paulo (A mutilação da alma brasileira: um estudo arquetípico. São Paulo: Vetor, 2006, p. 31).
Se assim compreendermos, precisamos nos encontrar com os mitos que atuam no inconsciente coletivo, que possivelmente, povoaram nossos sonhos enquanto “dormíamos”, a saber: Saci, Curupira e Mula-sem-cabeça.
O menino de uma perna só, contudo, velozmente ágil, o Saci-Pererê, portando um cachimbo em sinal de afronta aos não fumantes e um gorro vermelho, sinalizando sua proximidade à magia e misticismo e a sua sensualidade, anda a espreita, pronto às estripulias, subvertendo as realidades da vida que deveriam seguir tranquilas e sem dificuldades, provocando grandes, atormentadoras e tumultuadas confusões, atrasando a efetividade de qualquer coisa desejada, emitindo gargalhadas debochadas todas as vezes que alcança sucesso em suas intenções maliciosas, e desaparece como num vento.
Precisamos perceber que não são poucas as vezes que agimos como Saci. Alarmantemente inconscientes, somos muito parecidos com ele. Apreciamos “brincadeiras” maliciosas, anedotas ardilosas, sem medir as consequências, mesmo quando negativas e depreciadoras, e talvez, por isso, preferidas. Governantes, partidos políticos e movimentos sociais, às vezes, fazem propostas que tumultuam situações que poderiam ser resolvidas sem grandes dificuldades.
Assimilar à consciência este lado significa: admitir as malandragens, as espertezas, as atitudes indisciplinas e incoerentes que tomamos na vida pessoal, familiar, social, política, econômica e espiritual. O Saci está solto. Só tomando sua consciência podemos recolhê-lo das ruas, lares, templos, escolas, gabinetes e palácios.