domingo, 23 de fevereiro de 2014

Fantasias de Carnaval

As máscaras carnavalescas passaram a ser usadas nos bailes instituídos pelo papa Paulo II (1464-1471), mas somente no final do século XIX, durante o Entrudo, festa dos bonecos gigantes em Portugal, os foliões passaram a ser instruídos pela Igreja a adotarem comportamentos pacíficos e a evitarem excessos ilícitos, segundo Carlos de Gouveia e Melo, num belíssimo trabalho de doutorado na Universidade de Lisboa, acerca do uso, diversidade e funcionalidades das máscaras (Prolixidade do funcionamento de máscara ou do efeito-máscara. Portugal, 2011).
O carnaval configura-se como um período de inversão da ordem dominante, durante o qual somos levados a nos mascarar quando buscamos outras formas de representar o encontro com a nossa sombra pessoal. Como afirmam Connie Zweig e Jeremiah Abrams: “Cada um de nós contém [...] uma persona agradável para o uso cotidiano e um eu oculto e noturnal que permanece amordaçado a maior parte do tempo. Emoções e comportamentos negativos – raiva, inveja, vergonha, falsidade, ressentimento, lascívia, cobiça, tendências suicidas e homicidas – ficam escondidos logo abaixo da superfície, mascarados pelo nosso eu mais apropriado às conveniências. Em seu conjunto, são conhecidos na psicologia como a sombra pessoal, que continua a ser um território indomado e inexplorado para a maioria de nós” (Ao encontro da sombra. São Paulo: Cultrix, 2012, p. 15).
Depois de 365 dias um “eu” se liberta dos falsos moralismos, do peso e da força das convenções sociais e da fria racionalidade, tentando conectar-se com um eu autêntico que vive sob as sombras, por isso, rejeitado e não reconhecido, mas portando aspectos inconscientes bons e maus.
Esta é a contribuição de Momo: que vivenciemos o “pensamento não dirigido”, conforme C. G. Jung (Símbolos da transformação. Petrópolis: Vozes, 1989). Quer dizer: através da fantasia e da imaginação podemos nos aproximar e assimilar à consciência os elementos que nos constituem como: o “Outro dentro de nós, (através do qual) ficamos conhecendo aspectos de nosso ser, que jamais permitiríamos que outros nos mostrassem e jamais admitiríamos perante nós mesmos” (JUNG. Mysterium Coniunctionis. Petrópolis: Vozes, 1990, p. 251).
Segundo John Sanford (1929-2005): “Não somos unidades homogêneas de vida psíquica, mas possuímos uma inevitável oposição dentro da totalidade que forma o nosso ser. Existem opostos dentro de nós, podemos chamá-los do que quisermos – masculino e feminino, anima e animus, Yin e Yang – e eles permanecem eternamente em tensão e estão eternamente buscando a união. A alma humana é uma grande arena em que Ativo e Receptivo, a Luz e as Trevas, Yang e o Yin procuram unir-se e forjar dentro de nós uma indescritível unidade de personalidade. Realizar essa união dos opostos dentro de nós pode muito bem ser a tarefa da vida, tarefa que exige o máximo de perseverança e de atenção assídua” (Os parceiros invisíveis (São Paulo: Paulus, 1987, pp.147-148).

A ludicidade do carnaval, enquanto ritual coletivo, conforme entendia o pai da sociologia moderna Émile Durkheim (1858-1917), favorece a aproximação com aquilo que é tido como elemento que se opõe à nossa vida. As fantasias de carnaval são a exteriorização daquilo que está dentro de nós aguardando ser assimilado à consciência.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Psicocine

PsicoCine
PsicoCine é um projeto que se propõe analisar e refletir sobre as produções cinematográficas que possam ser usadas como instrumento de aplicação e discussão de temas relacionadas a Psicologia,  fomentando a potencialidade do cinema como processo de criação de modos de existência, produção de subjetividades, desejos e realidades,  em sua dimensão estética, ética e psicológica.

Filme:
UP - Altas Aventuras: Bom e Mau Humor, Criatividade e Individuação
Dia 22 de Fevereiro de 2014
Horário: 17h00
Local: Salão Paroquial da Matriz Santo Antônio (entrada pela R. Prudente de Moraes)
Evento gratuito

XXX InterQuinta_Jung – Debate

Exibirá o filme: “Caramelo”, seguido de debate.
Sinopse:  Em Beirute (Líbano), no salão de beleza Sibelle, quatro mulheres se encontram regularmente. Entre cortes de cabelo e depilação a base de cera de caramelo, deixam transparecer seus conflitos cotidianos. Layale é amante de um homem casado; Nisrine é mulçumana,  vai se casar e não sabe como resolver o problema de não ser mais virgem; Rima sente atração por mulheres; Jamale não aceita o envelhecimento e Rose abdicou de sua vida para cuidar da irmã mais velha. Temas como cultura, construção de identidades de gênero, amor e sexualidade  estão presentes neste filme e serão objetos de debate.

    Informações Técnicas
    Título: Caramelo     País de Origem: França / Líbano
            Ano de Lançamento: 2007
            Recomendação: 10 anos  Direção: Nadine Labaki  Gênero: Comédia Dramá
            Duração: 95 minutos        
Elenco: . Nadine LabakiYasmine ElmasriJoanna MoukarzelGisèle AouadAdel KaramSihame HaddadAziza Semaan.
Data da Exibição: 27/02/2014
Horário: 20h00      
Local: Sala de Projeção Municipal, piso superior da Biblioteca Municipal. Entrada pela Av. Rio Branco.
DebatedoraMartha dos Reis -  Doutora em História, Professora e Pesquisadora da UNESP/MaríliaAtualmente participa de pesquisa sobre o desenvolvimento da Psicanálise em Marília  e região e dos Grupos de Estudos: 1) Anima, do CCEJ – Clínica e Centro de Estudos Junguianos, coordenado por Eneliz Mafalda Capellini e 2) Grupo de Estudos sobre Temas Variados, coordenado por Gisele Demarchi.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Pensar e sentir em "remodelação"

Pensar e sentir como funções psíquicas estão interligadas.
Interpretamos (pensamos) ativa e passivamente sobre tudo aquilo que nos chega à percepção, conforme Carl G. Jung (Tipos Psicológicos).
Pensamos ativamente ao nos envolvermos por e com vontade própria, tanto ao que nos acontece como às emoções geradas pelos fatos; neste sentido, o intelecto dirige nossos posicionamentos frente aos eventos e às emoções, nossas e de terceiros. Pensar passivamente significa deixar que as ideias se conectem umas às outras espontaneamente, sem uma participação dirigida; é deixar-se, intelectualmente, ser conduzido pela intuição, no campo físico e pessoal.
Sentir é a capacidade de avaliação do que nos acontece externa e internamente; trata-se de refletir subjetivamente quanto à necessidade de enfrentar e de recuar frente às ocasiões com que nos deparamos.
A vivência destas funções modera tanto o racionalismo quanto a fantasia, quer dizer, nos protegemos da frieza intelectual e, puramente, sentimentalistas.
Na atualidade, pensar e sentir se dá no âmbito da vida urbana e, hoje mais do que nunca, sentimos os efeitos da dissociação destas funções.
Conforme o historiador e crítico de arquitetura, tcheco, Sigfried Giedion (1888-1968): “O caos de nossas cidades, não pode ser explicado tão só pelas condições sociais e econômicas. As ações são postas em marcha mediante impulsos sociais e econômicos, mas cada ato humano está sob influências, e inconscientemente plasmado por um ambiente emocional específico. O mesmo ocorre com a política e o governo. Na base de cada sistema político se acham indivíduos cujas ações refletem sua preparação intelectual e emotiva. No momento em que se produz uma cisão, o núcleo interno da personalidade fica separado por uma diferença de nível entre os métodos de pensar e os do sentir. Seu resultado é o símbolo do nosso tempo: o homem dissociado, inadaptado” (Espacio, tiempo y arquitectura. Ed. Reverté. Barcelona/Espanha: 2009, p. 788-789).
As condições de vida nas cidades têm nos levado a um elevado nível de estresse e, as consequências estão aí: baixo nível de tolerância para com o contínuo descaso das autoridades pela baixa qualidade dos serviços públicos, insegurança, ruas esburacadas, alta de taxas e impostos; ansiedade gerada pela incerteza quanto ao que virá depois dos protestos iniciados em junho de 2013; distúrbios mentais, como depressão e outros transtornos psíquicos, porque vemos as nossas condições de vida piorar; chegando até, em alguns casos, à perda da identidade própria.
Estamos num momento em que as funções psíquicas de pensar e sentir estão se “remodelando”.
As estruturas do saber e poder incestuosamente ligadas e corroídas, que ocupam os espaços espirituais, intelectuais, políticos e econômicos, querem nos fazer crer que o movimento psíquico em curso levará ao fim da sociedade de consumo, dos partidos políticos, da “ordem moral e ética” que controlam sob a força e a violência.
A luta travada no mundo exterior se dá no nível interior de cada um de nós. É preciso acompanhar o processo de “remodelação” do pensar e do sentir, assimilando os seus conteúdos à consciência, se quisermos construir uma sociedade melhor.

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Perspectivas para um mundo em crise e transformação

VI SIMPÓSIO DO INSTITUTO JUNGUIANO DE SÃO PAULO

Perspectivas para um mundo em crise e transformação
Palestras de autores junguianos sobre diversos aspectos do tema.
Entrada: Gratuita
Data: 22/03/2014 sábado
Horário: 9:00 hs às 15:00 hs
Local: UniPaulistana (auditório)
Endereço: Rua Madre Cabrini, 38 Vila Mariana, São Paulo
Inscrições: Vanessa 3030-9315

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Conheça a Clínica de Psicologia

No endereço:

http://silvioperes.wix.com/clinicadepsicologia
Seja bem vindo!

PsicoCine

PsicoCine é um projeto que se propõe analisar e refletir sobre as produções cinematográficas que possam ser usadas como instrumento de aplicação e discussão de temas relacionadas a Psicologia,  fomentando a potencialidade do cinema como processo de criação de modos de existência, produção de subjetividades, desejos e realidades,  em sua dimensão estética, ética e psicológica.

Filme:
UP - Altas Aventuras: Bom e Mau Humor, Criatividade e Individuação
Dia 22 de Fevereiro de 2014
Horário: 17h00
Local: Salão Paroquial da Matriz Santo Antônio (entrada pela R. Prudente de Moraes)
Evento gratuito

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Andarilhos, somos todos nós

            O andarilho busca se encontrar numa experiência de vida que, para a maior parte das pessoas, no mínimo, é muito estranha. Não é possível categorizar a sua opção de vida: não é a do peregrino, não é a do viajante, nem do itinerante, porque “parece” não possuir um endereço “normal”, para que retorne “a uma vida normal”.
Como afirma o psicólogo e membro do Instituto de Psicologia Analítica de Campinas (IPAC), Alessandro Caldonazzo Gomes: “Sugerem ser indivíduos aparentemente sem objetivos, simplesmente errantes, sem rumo, sem propósito, marginais”, (O Trecho do Mundo: um olhar sobe a individuação do andarilho. São Paulo: Cadernos Junguianos, nº 6, 2010, p. 93).
Tratados pela maioria das pessoas, inclusive por aquelas que deveriam ajudá-las a minorar os sofrimentos a que estão sujeitos, como: “maloqueiro”, “sem-teto”, “pedinte”, “mendigo”, “desocupado”, “preguiçoso”, “vagabundo”, “bêbado”, “marginal”, “pobre”, “doido”, etc, os andarilhos, na verdade, estão sendo atacados.
Contudo, o ataque revela os aspectos sombrios inconscientes que o restante da sociedade projeta sobre eles. Trata-se de um mecanismo de defesa contra a ansiedade gerada pelas emoções difíceis e/ou das partes inaceitáveis da personalidade, provocando um sentimento (provisório) de libertação e de bem-estar.
“Todo mundo carrega uma sombra, e, quando menos ela está incorporada ao consciente do indivíduo, mais negra e densa ela é. Se uma inferioridade é consciente, sempre se tem uma oportunidade de corrigi-la. [...] Porém, se ela é reprimida e isolada da consciência, jamais é corrigida, e pode irromper subitamente em um momento de inconsciência. De qualquer modo, forma um obstáculo inconsciente, impedindo nossos mais bem intencionados propósitos”, conforme Carl Gustav Jung (Psicologia e religião. Petrópolis: Vozes, 1990, p. 81).
Desejosa por viver num ambiente seguro, de amparo, com certezas, de ações e decisões planejadas e organizadas, de valores defendidos nos limites da legalidade, das regras, muitos projetam sobre os andarilhos o temor por passar necessidades que, sem aviso prévio, podem ser levados a passar, especialmente por erros cometidos ou da indefinições a que estão sujeitos.
Porém, sempre é bom lembrar-se do que afirma Caldonazzo Gomes (idem, p. 99): “A alma humana é essencialmente errante. [...] A alma anseia pelo seu lugar no mundo, mas não um lugar definido em um corpo, não em um lugar territorial, não um lugar abstrato. A alma não tem forma definida, a alma não tem muros, a alma não tem pátria”.
Assim sendo, todos nós somos vulneráveis, frágeis, com parcos recursos que façam frente à precariedade, à soledade, à desproteção e rupturas sociais que abalam a ordem psicossocial egocentricamente estabelecida.
A alma está nos conduzindo, para conhecermos outras paragens, especialmente num contexto de amplo e intenso processo de desregramento moral e ético global.
Nesta condição precisamos aprender a cuidar de algumas patologias, tais como: solidariedade anoréxica, de delírio de grandeza (complexo de poder), de um desenvolvimento tecnológico maníaco, de ansiedade por lucros e riquezas, ...

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Pensar e sentir na resolução de problemas

A recusa em refletir psicologicamente a respeito das manifestações coletivas, a que estamos presenciando nos últimos tempos no País, contra a violenta e opressora repressão da polícia, a impunidade aos crimes contra o erário público, a falta de vontade política de estabelecer serviços de saúde, educação e transporte públicos de qualidade e aos discursos vazios que intentam desviar a atenção de muitas pessoas dos reais e graves problemas sociais do País e da cidade, revela a importância dada à superfície das coisas, preferindo fugir de experimentar a essência interior de cada um de nós.
As grandes soluções para os grandes problemas exteriores que enfrentamos passam por resolver os assuntos referentes aos mesmos dentro de nós. Nossos problemas sociais são fruto da nossa maldade pessoal. “A alma é o ponto de partida de todas as experiências humanas, e todos os conhecimentos que adquirimos acabam por levar a ela. A alma é o começo e o fim de qualquer conhecimento”, segundo Carl Gustav Jung (A natureza da psique. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 61). 
            Contemos dentro de nós exatamente aquilo que estamos combatendo fora.
“A diferença entre um problema pessoal e um coletivo é que um problema pessoal deriva inteiramente de nós mesmos, das nossas próprias insuficiências pessoais. Mas, um problema coletivo chega a nós devido ao fato de que vivemos em coletividade”, conforme C. G. Jung (The Visions Seminars, 1933).
            O Complexo de Poder que se caracteriza por (relembrando o artigo anterior): egocentrismo narcísico (para exercer o poder, as necessidades alheias tendem a ser ignoradas), autoritarismo, intolerância à contradição, competitividade, apego ao Poder, acúmulo de riqueza, fala com ar de comando, corrupção, inveja, baixa tolerância a frustração, ostentação, aversão aos símplices, ambição, delírio de grandeza, etc, nos leva a um estado de “intoxicação emocional”, quer dizer, nossa mente fica obscura, insegura, turvada sob o poder fascinante a que o consumismo, por exemplo, nos leva, daí darmos mais importância ao que acontece na superfície da realidade exterior, e nos afastamos da nossa essência pessoal.
            Afastar-se é o mesmo de negar ou reprimir aquilo que somos de obscuro e destrutivo. Entretanto, afastar-se não significa eliminar ou erradicar, mas recolher no inconsciente, porém, deste modo acumulamos energia tal, que geralmente, ao explodir causa destruição e sofrimentos.
            Nestes momentos se faz necessário desenvolver pensamentos e sentimentos, porque nada pode funcionar enquanto estamos sob o efeito perturbador das emoções.
            Pensar e sentir significa tentar entender, discriminar, avaliar o sentido e o significado das emoções, integrando à consciência o seu conteúdo, para que ocorra, então, crescimento e sabedoria.
            Cabe nos confrontar e satisfazer às exigências que os pensamentos e sentimentos nos propuserem, nesta tarefa: “A paciência é fundamental. Coragem para enfrentar a ansiedade. Dedicação contínua no sentido de uma disponibilidade para perseverar, a despeito de todas as modificações de humor e de estado mental, no esforço de pesquisar e compreender aquilo que está ocorrendo”, conforme Edward Edinger (Anatomia da psique. São Paulo: Cultrix, 1995, p. 25).