terça-feira, 27 de maio de 2014

InterQuinta Jung - 29.05.14 - 20h00

29/maio/2014                            CINE CULTURA                              ENTRADA FRANCa
  

29/05/2014 – Filme: Valentin.
Sinopse:  Valentin (Rodrigo Noya) é um menino com 08 anos de idade que vive com sua avó (Carmem Maura). Filho de pais separados sonha em ter alguém para chamar de mãe e esta oportunidade surge com a nova namorada de seu pai (Julieta Cardinali). Valentin divide seu tempo sonhando em ser astronauta e ouvindo as histórias contadas por sua avó. Temas como infância, composição familiar e recursos individuais para lidar com adversidades da vida estarão presentes no debate.


Comédia dramática.  Argentina. Roteiro e direção de Alejandro Agresti.  2003. 88 minutos.
Debatedora: Regina de Baptista Colucci – Psicanalista; Membro Efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo; membro do Núcleo de Psicanálise de Marília e Região; participante ativa de vários eventos culturais da cidade de Marília, entre eles: AmoClássicos, lançamentos de livros e noite de autógrafos no Spacio Sabor & Saber. Foi, por longo tempo, impulsionadora do Clube de Cinema de Marília.


Você tem medo de viver?

Fantasiar ou imaginar não goza de bom conceito, especialmente, quando refletimos quanto aos avanços tecnológicos que nos parecem terem saído de mentes racionais brilhantes. É que nossas fantasias carecem de “provas científicas”.
            Entretanto, mesmo não sendo possível “prová-las cientificamente”, fantasiar ou imaginar sempre fez bem a psicologia humana e, isto deveria nos ser suficiente.
            Não precisamos provar se nossas fantasias (religiões, mitos, lendas, etc) são verdades absolutas, ou não. O que podemos concluir é que aqueles que se voltam contra a fantasia, a imaginação, se desesperam diante da morte, sentem-se desenraizados, desorientados, diante da falta de sentido da sua existência.
            Quando fantasiamos: inventamos, diminuímos, distorcemos, superamos, extravasamos, fortalecemos, suportamos melhor a realidade. A fantasia nos sensibiliza e nos põe em movimento, intuitiva e criadoramente, a buscar por experiências de maiores significados, para soluções que não vemos no momento.
            Fantasiar ou imaginar quebra os padrões do pensamento dominante, ainda que científico, mas que nos deixam imóveis. Fantasiar ou imaginar nos coloca diante de novos conceitos que nos colocam em um desenvolvimento mais dinâmico.
            “Esse espetáculo da velhice seria insuportável se não soubéssemos que nossa psique atinge uma região imune à mudança temporal e à limitação espacial. Nessa forma de ser nosso nascimento é uma morte, e nossa morte é um nascimento. Os pratos da balança se equilibram” (JUNG, citado por VON FRANZ, M. L. Os sonhos e a morte: uma interpretação junguiana. São Paulo: Cultrix, 1996, p. 178).
            Viver é manter livre e selvagem a “região imune à mudança temporal e à limitação espacial”, a que a velhice impõe tão severamente, com a permissão de algumas pessoas. É ser “rico de invenção”, como afirmou Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) acerca de Cora Coralina (1889-1985), que somente aos 76 anos de idade lançou seu primeiro livro “Vintém de Cobre”, que mesmo sendo idosa, escreveu: “Procuro superar todos os dias minha própria personalidade renovada, despedaçando dentro de mim tudo que é velho e morto. Venho do século passado e continuo nascendo diariamente” (DEBÓFRIO, D. F. Cora Coralina: melhores poemas. 2ª Ed. São Paulo: Global, 2004, p. 224).
            Viver é saber que é preciso manter-se no processo pessoal de crescimento, que procura harmonizar o inconsciente com o consciente, ainda que por fora, pouca coisa contribua para alcançar e chegar até ao fim.
            Ou ainda, fantasiar e imaginar são explicados pelo filho que disse à mãe como o seu pai ensinou-lhe a dormir: “Eu me deito na cama e fecho os olhos, então imagino e começo a me sentir como se estivesse dentro de uma banheira com água morna, meu corpo vai ficando mole e pesado como se me esquecesse dele. E enquanto isso meus pensamentos são como bolhas de sabão que saem de dentro da banheira, ficam por ali flutuando um tempo e depois se vão, podendo ou não aparecer outra bolha de pensamento. Daí durmo...” (AMORIM, L. P. C. A importância da função imaginativa. Anales del I Congreso Latinoamericano de Psicologia Junguiana. Puenta Del Leste, Uruguay, 1998).

            Você tem medo de viver? Fantasie ou imagine! Viver é fazer “bolhas de sabão”.

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Você tem medo de morrer?

Gostamos de pensar que viver é como ser um relógio automático ou de quartzo, que dispensa o antigo mecanismo da corda manual. Entretanto, mesmo um relógio que detém a mais avançada tecnologia pode ter seu funcionamento parado por falta de movimento. E, ainda: não contamos que em algum dia o relógio parará para sempre.
            Diante da morte, não pensamos em outra coisa senão, no sentido e no valor da vida. Enquanto a criança e o jovem lutam por objetivos distantes e constroem o futuro, o doente terminal e o ancião sentem, relutante e impotentemente, a proximidade do túmulo. Por mais otimistas que tentamos ser, quando o assunto acerca do fim surge em nossas conversas, logo procuramos mudar de assunto. Medo. Não queremos falar, pensar, refletir sobre a morte, por medo. Medo do que? Medo de ver submergir na escuridão do esquecimento tudo que amamos, procuramos, esperamos, possuímos, desejamos. O medo nos sufoca, por isso buscar “ar” em outros assuntos.
            Mas, nosso maior problema quanto ao tempo de vida é quando como que paramos os ponteiros do relógio, e imaginamos que o tempo pode ser detido. Ou seja, por temer a vida, psicologicamente ficamos parados em algum estágio da infância ou juventude. Julgamos que podemos deter o curso da vida; assim, ficamos petrificados, enrijecidos, estáticos olhando para trás, cultuando um tempo que não existe mais. Se a morte é garantida, por que fugimos? Quanto mais fugimos dela, mais ela se aproxima e se realiza. No fundo, quem assim age tem um medo secreto de viver no coração. Perde-se, desse modo, uma relação vital com o presente; é não querer viver. Não aceitar que viver tem um destino final é uma forma de recusar a plenitude da vida. Enquanto nos agarramos ao passado, ficamos presos à juventude, ou melhor, à sua ilusão.
            Quem tem 30 anos de idade, por exemplo, mas vive como se tivesse 15/18 é tão lamentável quanto aquele que tem 60/70 e vive como se tivesse 20/25. Para C. G. Jung: “Um jovem que não luta nem triunfa perdeu o melhor de sua juventude, e um velho que não sabe escutar os segredos dos riachos que descem dos cumes das montanhas para os vales não tem sentido, é uma múmia espiritual e não passa de uma relíquia petrificada do passado. Está situado à margem da vida, repetindo-se mecanicamente até à última banalidade. Pobre criatura aquela que necessita de tais fantasmas” (A natureza da psique. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 360).
            A longevidade é produto da civilização, mas chegar à velhice parecendo jovem é desperdiçar o sentido da vida, quer dizer, é como se viver não tivesse algum objetivo. Se do nascimento até os 20/30 anos somos preparados para viver, por que os anos 30/40/50/60 anos restantes, não haveriam objetivos a serem alcançados?
            Quem está envelhecendo, quer queira quer não, deve se preparar para a morte. E, qual a melhor maneira de se preparar para morrer?

            Fantasiar, imaginar a respeito da própria morte. Lidar, antecipadamente, com o futuro. A fonte das fantasias é a nossa psique. Para a psique a morte não tem importância. Imaginar suscita um profundo sentimento de emoção, memória, sentimentos e imagens. É como lançar uma ponte entre o mundo exterior e interior. É pensar não dirigidamente. É fazer alma. É não esquecer a alma. Imaginar, fantasiar desperta o saber intuitivo, criador, a capacidade de se emocionar e de criar humanidade. É um movimento espontâneo e tem uma forma toda pessoal. É não cair no sentimento de vazio, na ânsia por significados e preenchimentos que não respondem às soluções banais das sementes do desespero.

domingo, 11 de maio de 2014

A "boa mãe"

            A mãe, ou alguém que a substitua, é para a criança não só a sua condição prévia física, mas também psíquica, conforme Carl Gustav Jung (1875-1961), em “Os arquétipos e o inconsciente coletivo. (Petrópolis: Vozes, 2000, p. 109). A mãe é a primeira fonte de alimento, calor, proteção e ternura em todos os setores da vida da criança.
            “O bebê vive psicologicamente dentro da mãe durante seu primeiro ano de vida, como viveu fisicamente antes do nascimento”, conforme o psicólogo analítico, escritor e um dos mais talentosos alunos de Jung, Erich Neumann (1905-1960), em seu “O medo do feminino” (São Paulo: Paulus, 2000, p. 221).  
            A mãe, então, tem uma posição tão significativa, “transpessoal, arquetípica”, isto é, ela reúne em uma só pessoa “o mundo e o eu” do filho, quer dizer, a mãe “engloba, contém e dirige a nossa vida”, conforme Neumann.
            Para este autor, se os animais adquirem uma independência própria logo após o nascimento, o mesmo não acontece com os seres humanos. Só depois do primeiro ano de vida adquirimos um senso de estabilidade, liberdade e inteligência, isto é, independência, sentimento de importância que tem no mundo, de alguém que existe e pode sobreviver sem a idealização da mãe.
            A mãe fornece os primeiros laços do filho com ele próprio, e isto é fundamental para a sua (do filho) sobrevivência como um ego promissor que se desenvolve diante das realidades que passa a conhecer com segurança em si mesmo quando ela “falha”, por exemplo, se ausentando e, além de compreendê-la aprende a atender a si mesmo, constrói um “ego heroico”, isto é, assume os riscos, os perigos e os sofrimentos próprios, descobre a própria individualidade.
            Quando este processo é evitado, preferindo-se permanecer no conforto dos braços da mãe a enfrentar as batalhas pessoais, ou a mãe impede o desenvolvimento do filho, mantendo-o ligado a ela, motivada por questões próprias não assumidas, favorece-se a ativação de processos psíquicos terríveis, isto é, a situação externa desencadeia um processo psíquico, no qual certos conteúdos se juntam e dispõem à ação, mas sob a influência de uma energia que não é deles, mas dos próprios conteúdos, como: cansaços e desistências frente às dificuldades, escapismos e/ou procrastinações; medo do mundo externo e interno; ansiedade; vícios (dependências químicas, jogos de azar, etc); psicoses; e, “coletivamente, isto pode ser expresso externamente por uma guerra não evitada, ou uma ditadura não evitada”, segundo Neumann (p. 233).
            Uma “boa mãe” percebe quando o filho quer ser ele mesmo, e não só permite como facilita este processo de libertação, desprende-se do filho afastando-se para o seu progresso, guardando no coração a experiência de não dominar a situação.
            E, o pai ou o seu substituto, qual a sua função? “A ausência de uma figura paterna tem efeito destruidor no desenvolvimento do ego da criança, independentemente de se a causa dessa ausência está numa fraqueza de caráter ou numa doença, de se ele é atraído para fora de casa pelo trabalho ou por um caso extraconjugal, ou está “ausente” em virtude de morte ou de guerra. O efeito sobre a criança é sempre negativo, visto que a situação familiar especifica da espécie não é atendida” (Neumann, p. 238).

domingo, 4 de maio de 2014

Podemos interferir em nossa história!

            Se a energia psíquica não se restringe a de natureza sexual, conforme o pensamento da psicologia analítica de C. G. Jung, mas inclui todos os aspectos da natureza humana como: a mente, o corpo, a linguagem, a sexualidade, a alimentação, o mito, a religião, a arte, os jogos, o trabalho, o amor, o ódio, e todas as atividades ligadas à cultura, precisamos considerar que isto é altamente importante para a saúde psicológica de um indivíduo, mas também para um grupo social como a uma família, a uma empresa, a um partido político, a uma denominação religiosa, a uma agremiação esportiva, a uma cidade, até a um país.
            É que a libido é um fator psíquico dinâmico, isto é, provoca transformações e deslocamentos em um único indivíduo, mas também na vida de uma coletividade.
Quanto à história, narrada pelo passar dos tempos, a energia psíquica pode nos segurar no passado, como nos por em direção ao futuro. Quer dizer: podemos repetir pensamentos e decisões como as do passado, distante ou próximo, gerando assim uma ação regressiva, como se viver fosse olhar pelo “retrovisor”, levando-nos a repetir fatos e acontecimentos, ou podemos renovar-nos, assumindo novas posturas frente às realidades que se nos apresentam.
Neste sentido, é possível dar outro significado ao que passou, seja na história de cada um de nós, da cidade e do País. Não há outra opção de contar a nossa própria história, senão contando-a de outro jeito.
Experimente pedir a uma criança para imaginar a chegada dos pioneiros de Marília, por exemplo, e verá como a sua leitura será diferente. Muito provavelmente, ela contará que haveria mais solidariedade aos kaingang; mais honestidade nos negócios, na geração de riquezas; a forma emocional de lidar com o poder, mais democrática.
Mas, cada um de nós é chamado a fazer, hoje, uma releitura para que experimentemos o poder transformador disponível na energia psíquica, que nos leve a uma vida urbana mais calorosa, mais saudável, com mais “alma”.
Não podemos deixar passar a vontade de protagonizarmos a nossa própria história. Não podemos delegar a história da nossa cidade àqueles que se mostram comprometidos para que o passado continue se repetindo. Não podemos aceitar as ideias do: “dane-se”, “o que é que eu posso fazer?”
As vozes críticas precisam permanecer. Não podemos nos calar. Podemos sim, nos orgulhar de nossa própria história e da nossa cidade, deixando-nos mover pela energia psíquica em nós atuante. As decepções não são para proibir nossos sonhos, mas para nos tornar mais fortes. Podemos interferir sempre em nossa história!
Isto nos co-move, isto é, nos mobiliza a uma ação diferenciada das que costumeiramente temos tomado frente a nós mesmos. Precisamos olhar-nos com outros olhos. Olhar a nossa negatividade camuflada de empreendorismo, a nossa destrutividade mascarada de progressismo, a nossa perversidade travestida de solidariedade.

Somos capazes de lidar com a dureza dos corações de nossos governantes e resistir com imaginação, coragem e amor pelas futuras gerações que não param de chegar.