Segundo Hesíodo, em “Teogonia: a origem
dos deuses” (750 a. C.), Cronos assassina o pai Urano e devora seus próprios
filhos, por temer a perda do trono. Sua irmã e esposa Reia, o leva para a ilha
misteriosa de Lictos depois de perder o trono para um de seus filhos, Zeus, o
qual se safa da ira paterna o constitui rei dos bem-aventurados, onde reina com
sabedoria, justiça e amor proporcionando abundância, harmonia e felicidade.
Cronos,
um dos vários arquétipos do espírito humano, revela-se num deus devorador de
todas as novidades que seus filhos podiam trazer ao mundo, e mais tarde em um
deus sábio, proativo e mentor de novas perspectivas de vida.
Se
aplicado à realidade dos professores, o mito grego nos faz considerar: o
professor que se identifica com o deus devorador não facilita a discussão de
novas ideias, inibe as iniciativas dos alunos na busca por conhecimentos,
centraliza-se como detentor do saber, e exige a submissão dos mesmos aos seus
padrões de pensamento e de comportamento.
Ao
aluno fica a certeza de que não passa de objeto indesejável, com consequências
desastrosas ao seu aprendizado, podendo gerar atitudes de violência contra este
estado de coisas a que está submetido, se sentindo à margem do processo do
ensino.
Quanto
ao relacionamento com seus colegas de magistério o professor “devorador”, por
exemplo, vê-se superior aos iniciantes na carreira e/ou competem entre si,
estabelece no ambiente de trabalho a inveja, a rivalidade e cobranças estranhas
ao processo de ensino-aprendizagem. Estas e outras situações são as causas de
estresse, falta de motivação para o trabalho, e problemas psicossomáticos, situações
que confirmam os dados da pesquisa realizada pelo Sindicato dos Professores do
Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOSP), citados no artigo anterior
(Quando o professor é forte – disponível no blog referido abaixo).
Contudo,
Cronos se mostra líder de uma era de avanços culturais, econômicos e sociais ao
povo de Lictos, graças à sua sabedoria, justiça, benevolência e paciência,
valores que são encontrados quando há uma alteração na direção da vida, para o
espírito.
É
preciso recuperar o sentido das palavras do pai da administração moderna Peter
Drucker (1909-2005): “Nosso desafio é tornar novamente o conhecimento um meio
para o desenvolvimento humano, é ir além do conhecimento como ferramenta e
recuperar a educação como o caminho para a sabedoria” (Drucker na Ásia. São
Paulo: Pioneira, 1997, citado por Robson Santarém, no artigo “Puer e Senex nas
relações de trabalho”, em Puer-Senex: dinâmicas relacionais. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2008, p. 183).
Se continuarmos
a negligenciar quanto a alteração pela qual precisamos passar, por nos
recusarmos a tomar ética e moralmente esta decisão, continuaremos sofrendo as
tristes realidades a que estão submetidos os professores. Segundo C. G. Jung
(1875-1961): “O arquétipo do espírito é certamente caracterizado como sendo
capaz de efeitos tão bons quanto maus, mas depende da decisão livre, isto é,
consciente da criatura humana, que o bem não se deteriore em algo satânico. Seu
pior pecado é a inconsciência, mas a ela se entregam com a maior devoção até
mesmo aqueles que deveriam ser mestres e modelos para os outros” (Os arquétipos
e o inconsciente coletivo. 2ª Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. 247).