Não é possível nos livrarmos da ideia de
que o poder tem um lado humano e subjetivo, apesar de normalmente procurarmos
chamá-lo de autoridade, comando, lugar ou centro de tomada de decisão. Estes
sinônimos são usados para camuflar a realidade de que o poder exerce forte
influência sobre nossas vidas, seja por aqueles que o detém ou pelos que se
submetem a ele. Preferimos os sinônimos técnicos a encarar a face humana do
poder. Por isso os subalternos têm olhos baixos ao cruzar com os poderosos, evitam
o olho-no-olho. Mas, numa sociedade comunitária, na qual estamos inseridos,
isto não favorece a prática de privilégios e a manutenção de cidadãos de
segunda classe?
Desde
os primeiros tempos, o poder é experimentado na vida familiar, onde o pai é considerado
o representante da lei - aquele que determina os limites daquilo que é ou não
permitido. Mais do que o pai individual, é a dinâmica paterna, isto é, o
predomínio do pensamento racional sobre a subjetividade em nosso dia a dia, que
estabelece forte tensão entre o conceito e a relação com o poder, conforme
Thaís A. Máximo, doutora em psicologia social pela Universidade Federal da
Paraíba (O poder e suas faces. Associação Brasileira de Psicologia Social. Belo
Horizonte, MG, 2010).
O
que nos diferencia enquanto pessoas e grupos é a detenção do poder: os que o têm
em suas mãos, e aqueles que se submetem.
Por isso, a
sociedade precisa sempre questionar as decisões que beneficiam a alguns, e
prejudicam os interesses da maioria. Quanto maior a rigidez do uso do poder,
maiores serão as barreiras sociais a serem superadas. Quanto menos importância
for dada às opiniões contrárias, menos significado terá o indivíduo e a possibilidade
de ouvi-lo. E, o mais grave, quanto mais o indivíduo considerar-se impotente
frente ao poder, até mesmo pelos seus representantes, menos será reconhecido
como protagonista dos fatos que envolvem a sua vida e a de seus pares.
Na vivência
social o poder está, inseparavelmente, ligado à personalidade do líder e à sua
competência, podendo dar ou não coesão e sustentação aos que representa.
No caso da
democracia, o poder precisa buscar legitimidade dos meios de controle que
aplica em seu exercício, para haver um verdadeiro desenvolvimento de todos. Daí
a necessidade de ficarmos atentos à manipulação daqueles que se encontram à
frente da coletividade.
Como observou
Zygmunt Bauman (1925-), sociólogo polonês: “Quanto maior a minha margem de
manobra, maior o meu poder. Quanto menos liberdade de escolha tenho, mais
fracas são minhas chances na luta pelo poder” (A sociedade individualizada:
vidas contadas e histórias vividas. Rio de Janeiro, Zahar, 2008, p. 47).
C. G. Jung
(1875-1961), tratando do caos que o abuso do poder trouxe ao mundo por ocasião
da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), aconselha a percebermos em nós mesmos a
tensão que a relação com o poder gera, com o propósito de adquirir consciência
acerca de quem somos. Não basta os protestos, que pouco contribuem para uma
real transformação das condições sociais negativas que o uso do poder provoca
em toda a sociedade, como também, até mesmo as autoridades espirituais podem
estar distantes da alma, e como hoje, afinadas ao discurso dos poderosos
(Aspectos do drama contemporâneo. Petrópolis, Vozes, 1988).
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