terça-feira, 20 de novembro de 2012

Depressão e religião


          Segundo Tákis Athanássios Cordás, Professor de Pós-Graduação do Departamento de Psiquiatria e do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPQ-HCFMUSP), a depressão na Idade Média era denominada “acídia”, termo grego para “falta de cuidado”, introduzido nos estudos teológicos sobre a condição de vida dos pecadores pelo monge Ioannes Cassianus (360-435), fora incluída na lista dos sete pecados capitais pelo Papa Gregório, Magno (540-604), identificada como “preguiça”, compreendida como indolência quanto às obrigações religiosas, e ainda: “estava inserida na demonologia da época” (Depressão: da Bile Negra aos neurotransmissores, uma introdução histórica. São Paulo: Lemos Editorial, 2002, p.33).
Conforme Antônio Máspoli de Araújo Gomes, Professor Titular da Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo e psicólogo junguiano, isto ocorria por que: “Nas sociedades primitivas não havia separação entre sofrimento mental, físico ou espiritual, como não havia separação entre medicina, magia e religião” (Eclipse da alma. São Paulo: Fonte Editorial, 2010, p. 137).
Apesar da passagem de mais de 1500 anos, esta visão ainda persiste entre os religiosos cristãos, daí os rituais de exorcismos, como tentativa de controlar o sofrimento humano.
Isto nos leva a considerar, sem generalizar, caso algum adepto desta visão sofra de depressão, pode ser levado a recalcar o seu rebaixado estado de humor, empenhando-se numa vida de aparente felicidade e a envolver-se em atividades religiosas pessoais, como reuniões públicas de “oração e louvor” devido a uma crença mal formulada e nutrir uma falsa esperança de cura, o que contribui para um sério agravamento do transtorno e gerar graves dificuldades ao seu tratamento.
Nestes casos, os “adoradores” reproduzem os rituais religiosos, na intenção de imitá-los e repeti-los, como que “macaqueando” sem, contudo, refletir no significado simbólico para si mesmo, tornando-os atitudes automáticas, mecânicas e artificiais de uma experiência que não pode mais ser repetida, gerando um tédio que fortalece o sentimento da depressão, mesmo que o que se deseja é se libertar dela.
Segundo o Dr. Máspoli: “Quando o rito perde o seu efeito ou não mais cumpre o seu propósito expiatório, o sofrimento psíquico, a doença e a depressão ocupam o lugar do sacrifício. A depressão sacrifica a libido, a energia do próprio indivíduo no ritual psicológico de expiação de uma culpa cujas causas são desconhecidas. O deprimido aqui é ao mesmo tempo a culpa e o rito expiatório. O sujeito é o sacrificador e o sacrificado de si mesmo. Todo sofrimento vivenciado na depressão equivale ao sofrimento da vítima sacrificial. O deprimido acredita que rompeu a sua ordem cósmica por um ato real ou imaginário. Acredita também que seu sofrimento é necessário para restabelecer o “nomos” (espírito de normalidade das coisas). No entanto, quanto mais sofre, mais sente culpa e aumenta a vontade de sofrer um sacrifício do ego, em um ritual sadomasoquista auto infligido. O sujeito permanece, desse modo, aprisionado num círculo fechado de culpa e sofrimento, sofrimento e culpa (Eclipse da alma. São Paulo: Fonte Editorial, 2010, pp. 145-146).

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