A natureza do
mal é uma ferida aberta nas ciências humanas, da teologia à psicologia. De um
lado a doutrina cristã “privação do bem” de Orígenes (185-253 d. C.), de outro,
totalmente antagônico, a teoria do médico psiquiatra Carl Gustav Jung
(1875-1961), para quem o mal é um elemento que precisa ser integrado à
consciência.
Pôr-se em termos com o mal é exercer
a capacidade de sentir as coisas como boas ou más, nobres ou horrendas, justas
ou injustas. A ausência desta pode nos transformar em instrumentos do mal,
ainda que estejamos realizando planos com as melhores intenções, e às vezes, em
nome de Deus.
As “melhores intenções”, assim
consideradas pelo julgamento racional (na maioria das vezes, ingênuo) ou pelo
sucesso obtido (resultados aferidos por números) podem nos levar a acreditar
que não somos sequer capazes de imaginar o mal. Como os políticos, por exemplo,
por executarem planos que beneficiam uma grande parcela da população, se
consideram acima do bem e do mal.
Quando uma nova administração da
cidade assume suas responsabilidades, faz-se necessário lembrar que o seu mal se
enfrenta muito mais por uma decisão pessoal de cada um dos cidadãos, e em
especial das suas autoridades.
A estas, a pequena e valiosa obra
“Presente e futuro” (Editora Vozes), Jung faz algumas observações que podem
contribuir para esta empreitada.
Cabe às autoridades: aprender
a desconfiar de seus reais motivos quanto ao que pretendem realizar, pois meras
palavras ou discursos, mesmo inflamados, não camuflam por muito tempo os
malfeitos; manter-se alerta às fronteiras da sua interioridade e de como esta
se relaciona com o que fazem na realidade externa, ainda mais se consideram
esta atitude sem sentido lógico e contrário à grande maioria das pessoas do
mundo da política, especialmente, seus líderes, como o próprio inconsciente
quer fazer crer; lembrar-se que o bem-estar e a segurança da cidade dependem mais
do seu equilíbrio psíquico do que do seu carisma pessoal, das influências às
esferas superiores (vide os recentes exemplos: José Dirceu, José Genuíno,
Eduardo Azeredo, etc.); não resistir aos opositores internos, pois não pode
responsabilizar pelas suas decisões somente ao mundo externo, especialmente
quando este aprova e elogia; duvidar da nababesca monarquia do ego, pois nenhum
de nós é senhor em sua própria casa, isto é, no inconsciente existem lados que
constituem a nossa personalidade que se não nos conscientizarmos destroem a
nossa vida e a nossa carreira; serem exigentes quanto ao exame e rigoroso conhecimento
de si mesmos, para descobrirem algumas verdades importantes sobre si, obterem
uma vantagem psicológica que os diferencia da maioria das pessoas que os
rodeiam e aprendam a avaliar se são dignos de tanta consideração e simpatia dos
simpatizantes e opositores; acreditar que as melhores realizações que podem
deixar para o registro da história estão na sua alma individual e não na
aglomeração das massas que os aplaudem, nem nas técnicas e planos econômicos de
crescimento que sofrem ataques inesperados; não julgar a consulta à consciência
moral como um exercício intelectual, senão será considerado como um fator
impopular ou um incômodo ideal que precisa ser negado, se, de fato, quiserem
ser responsáveis pelas atividades que pretendem realizar com inteligência.
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