A nossa sobrevivência subjetiva no mundo não
depende somente da nossa mãe como pessoa, nem de seu caráter pessoal, mas somos
influenciados por um arquétipo, um padrão presente em todos os lugares e tempos
históricos. Quer dizer, cada um de nós é como é, graças a uma forma
pré-existente de mãe que fortemente, primeiro, atuou em nossos antepassados, sobre
nossas mães e depois sobre cada um de nós. O arquétipo da Grande Mãe não pode
ser reduzido à nossa mãe pessoal, ou a qualquer outra pessoa que tenha
características de mãe, ou faça sua vez.
Hoje,
Dia das Mães, enaltecemos o polo positivo deste arquétipo: a capacidade de
gerar a vida, ou seja, a fertilidade; a solicitude e a bondade especialmente
nos primeiros momentos de vida, durante o primeiro ano; a sabedoria, muitas
vezes intuitiva, nos momentos que buscamos seus conselhos; a proximidade com o
Sagrado, considerada como proteção contra os perigos que, diariamente, nos
rodeiam.
Entretanto,
como todos os arquétipos, o da Grande Mãe também possui um polo negativo, como
pode ser percebido nos famosos contos de fadas dos irmãos Jacob Grimm
(1785-1863) e Wilhelm Grimm (1786-1859), “João e Maria” e “Branca de Neve”. Ambos
narram a relação mãe-filho: ora a mãe nos leva a vivenciar dificuldades,
abandonos, sofrimentos, e a morte – situações metaforizadas na madrasta-mãe, na
bruxa travestida de “boa mãe”, ou em nossas “rainhas-mães”.
Como
afirma o médico e psicólogo analítico alemão Erich Neumann (1905-1960): “É à
mãe que a criança dirige sua demanda de remoção do medo, e quando o medo não é
removido, a mãe é percebida como a mãe “terrível” que recusa” (O medo do
feminino. São Paulo: Paulus, 2000, p. 225). Mas, isto não quer dizer que a mãe
seja, pessoalmente, culpada por isto. Simplesmente, a criança não tem
possibilidades de entender que a mãe é inocente.
Para
Neumann, de a mãe revelar-se “terrível” também é uma experiência arquetípica,
pois independe do seu comportamento correto, como é parte do nosso processo de
maturidade psicológica.
Quer dizer, necessariamente, as
mães “são terríveis” queiram ou não queiram, gostem ou não gostem. É impossível
não sê-lo.
Mas, ainda segundo Neumann,
se permanecermos cultivando a figura idealizada da boa mãe, o lado positivo do
arquétipo, negando seu lado “terrível”, por temer as consequências, como o
inevitável sentimento de culpa, não só podemos apresentar “neuroses típicas de
ansiedade, e a fobias, mas também, e especialmente, a vícios, e, se o ego for
destruído de maneira extensa, a psicoses” (p. 233).
A nossa realização como
pessoas depende, e muito, de aceitarmos o lado “terrível” de nossas mães, ou
como nos ensinam os contos: encontrar sozinhos o caminho de volta para casa,
guiando-nos pela riqueza interna que os sofrimentos nos fazem encontrar, e
realizar um trabalho interno com os sentimentos de culpa, enérgica e
amorosamente, representado na atuação dos anõezinhos e do príncipe.
Mães, vocês precisam
prosseguir em seu próprio desenvolvimento psicológico, e isto passa,
necessariamente, em se apresentar aos filhos como uma pessoa com um ego mais
forte, menos regressivo ou subdesenvolvido, e neste processo, os seus maridos
contribuem para que toda a família seja bem sucedida nesta experiência.
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