A formação do povo brasileiro tem a marca da
mutilação verificada em nossa mitologia - Saci, Curupira e Mula-sem-cabeça -
conforme a psicóloga analítica Dulce Helena Rizzardo Briza (A mutilação da alma
brasileira: um estudo arquetípico. São Paulo: Vetor, 2006).
Temos
considerado tais mitos como imagens presentes em nossos sonhos, durante o tempo
em que adormecíamos, como o Gigante “deitado em berço esplêndido”. Figuras
teogônicas do imaginário, reinantes nas florestas, lembradas de norte a sul do
País, e narradas oral e literariamente não só por autores nacionais, como
também, estrangeiros.
O que nos interessa é que não
inventamos mitos, mas os experimentamos diariamente na lida diária como nação
brasileira. Não se trata de uma imagem pessoal, de alguém ou de algumas pessoas
especificamente, mas que nos expressamos psiquicamente, como eles são descritos,
coletivamente. Nossa vida psíquica é dominada por estes mitos, aqui expostos
devido à mutilação comum a eles, e por isso, reativam fatores em nossas almas,
em sua maioria, inconscientes, que interferem na construção de um País melhor.
Contudo, algo importante devemos refletir: temos de aproveitar os
acontecimentos que resultam de nossa inconsciência e que impedem avançarmos
numa agenda mais positiva, para que os transformemos em experiências que
ampliem nossa consciência pessoal e coletiva, facultando a descoberta de novas
possibilidades no enfrentamento dos mesmos.
Conforme Samuels: “Contos
míticos ilustram o que acontece quando um arquétipo tem a rédea livre e não
existe intervenção consciente da parte do homem. Contrastando com isso, a
individualidade consiste no confronto e diálogo com tais poderes fatídicos, reconhecendo
sua força primeva, mas sem submissão a ela” (Dicionário crítico de análise
junguiana. Rio de Janeiro: Imago, 1988, p. 128).
Quanto
ao Curupira: “As tradições representam-no como um pequeno tapuia com os pés
virados pra trás, e sem os orifícios necessários para as secreções
indispensáveis à vida” (O Selvagem, Couto de Magalhães, 1876, pp. 138-139,
citado por L. C. Cascudo, Geografia dos mitos brasileiros. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1947, p. 120).
Segundo
Briza: “Aqui nos deparamos com o andar que dissimula, desorienta, que também
pode ser entendido como mecanismo de defesa” (A mutilação..., p. 127).
Precisamos reconhecer, que
temos nos revelado hábeis criadores de disfarces em muitas questões da vida
nacional. São muitas as provas que o Curupira está vivo, porque o vivemos em
nossos lares, nas ruas, no trabalho, nas arenas políticas, sociais, culturais,
econômicas e espirituais sem uma “intervenção consciente”, mas descarada e
“submissamente”.
Não é possível esconder por
muito tempo, sem que as consequências apareçam, um contexto marcado por artifícios
montados, pois, fatos ou pessoas trazem à tona seja pela conduta ou por
comportamentos não-verbais o que se tentam esconder.
Atenção governantes: os
cidadãos não aguentam mais dados sociais e econômicos mascarados, discursos que
não correspondem às duras e cruas realidades das ruas, blefes políticos e
políticos blefes, compromissos ocultos. Antes, queremos: transparência já,
clareza nas opiniões e posições, desmascaramento das articulações, etc.
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