Todos nós estamos engajados numa
campanha “revolucionária”, como querem alguns, mas acima de tudo, emancipatória
dos políticos que não queriam ouvir, que gritávamos por melhorias nas condições
de vida do País. “A gente não quer só comida / A gente quer saída / Para
qualquer parte...” – já cantávamos com os Titãs. E, queremos acreditar que não
nos deixaremos calar, antes, instigados, encontraremos “saídas”.
As “saídas” precisam ser construídas, não estão prontas. Os códigos
legais, tão-somente sinalizam-nos as ferramentas que precisam ser utilizadas.
Buscamos “saídas” de nossas limitações históricas, pois, não podemos
mais aguardar por projetos messiânicos, mas de maneira madura, encontrarmos
formas saudáveis de enfrentarmos as próprias limitações.
Temos de ter paciência com as contradições nesse processo, refiro-me às
práticas violentas e criminosas por parte de alguns manifestantes nas ruas, às
manipulações viciadas dos partidos políticos que querem tirar algum proveito
eleitoreiro, mas precisamos, perseverantemente, continuá-lo. Lembremo-nos: as
contradições são parte do processo, que precisam ser assimiladas à consciência,
sem reprimi-las, porque não são empecilhos insuperáveis.
Desde que o “gigante acordou”, tem de enfrentar o desafio à sua evolução
em maturidade. “Quando retomamos nosso mito heroico, resgatamos nossa coragem e
retomamos nossa razão de viver e de enfrentar os desafios da vida, não só como
pessoas, mas também como nação”, conforme Dulce Helena Rizzardo Briza,
psicóloga analítica, presidente do Instituto Junguiano de São Paulo (A mutilação da alma
brasileira: um estudo arquetípico. São Paulo: Vetor, 2006, p. 31).
Se assim compreendermos, precisamos
nos encontrar com os mitos que atuam no inconsciente coletivo, que
possivelmente, povoaram nossos sonhos enquanto “dormíamos”, a saber: Saci,
Curupira e Mula-sem-cabeça.
O menino de uma perna só,
contudo, velozmente ágil, o Saci-Pererê, portando um cachimbo em sinal de
afronta aos não fumantes e um gorro vermelho, sinalizando sua proximidade à
magia e misticismo e a sua sensualidade, anda a espreita, pronto às
estripulias, subvertendo as realidades da vida que deveriam seguir tranquilas e
sem dificuldades, provocando grandes, atormentadoras e tumultuadas confusões,
atrasando a efetividade de qualquer coisa desejada, emitindo gargalhadas
debochadas todas as vezes que alcança sucesso em suas intenções maliciosas, e
desaparece como num vento.
Precisamos perceber que não
são poucas as vezes que agimos como Saci. Alarmantemente inconscientes, somos
muito parecidos com ele. Apreciamos “brincadeiras” maliciosas, anedotas
ardilosas, sem medir as consequências, mesmo quando negativas e depreciadoras,
e talvez, por isso, preferidas. Governantes, partidos políticos e movimentos
sociais, às vezes, fazem propostas que tumultuam situações que poderiam ser
resolvidas sem grandes dificuldades.
Assimilar à consciência
este lado significa: admitir as malandragens, as espertezas, as atitudes
indisciplinas e incoerentes que tomamos na vida pessoal, familiar, social,
política, econômica e espiritual. O Saci está solto. Só tomando sua consciência
podemos recolhê-lo das ruas, lares, templos, escolas, gabinetes e palácios.
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