Os
gregos antigos perceberam que todo ser vivo, inclusive os animais, necessita de
algo, e que a necessidade se impõe, indistinta e soberanamente, a todos como
uma deusa. Todas as necessidades, de natureza interna ou externa, dos
relacionamentos pessoais, familiares e de afinidades com o próximo, tudo que
envolve a sobrevivência e permanência das espécies era denominada, Ananke.
Ananke passou a
ser compreendida, mais tarde, em outras culturas e religiões como “espírito
guia”, “santo protetor”, “gênio” ou “anjo da guarda”, conforme o pastor
anglicano e analista junguiano norte-americano John A. Sanford (1929-2005), em
seu “Destino, amor e êxtase: a sabedoria das deusas gregas menos conhecidas”
(São Paulo: Paulus, 1999).
Como deusa,
Ananke exige cooperação. Quer dizer, quaisquer que sejam as nossas necessidades
desafiam-nos a nos envolvermos pessoalmente, como que dizendo-nos: “Que você
fará comigo? Posso contar com você para me resolver?”
Entretanto, na
maioria das vezes, preferimos atendê-las da maneira mais simples possível, com
o mínimo esforço, acreditando que alguém possa nos socorrer e assumir as
responsabilidades pelas consequências. Desse modo, resistimos a cooperar com
Ananke, levando a um agravamento das situações, às vezes, insolúvel.
A letra da
cantiga presente na grande maioria das celebrações de fim de ano - “Adeus ano
velho! Feliz ano novo! Que tudo se realize no ano que vai nascer! Muito
dinheiro no bolso, saúde pra dar e vender!” – exemplifica nossa resistência à
Ananke.
Não queremos
sentir necessidade de coisa alguma. “Muito dinheiro no bolso” – para nos
livrarmos das obrigações com o trabalho, e nos entregarmos aos prazeres do
lazer; “saúde pra dar e vender” – para que nada nos impeça no desfrute dos
prazeres advindos do dinheiro.
Objetamos
qualquer tipo de necessidade, porque nos são impostas exigências não desejadas,
não planejadas, que precisam ser atendidas; porque acreditamos que não podemos
precisar de coisa alguma, afinal, “bons” egocêntricos sabem o que quer fazer da
vida; porque necessidades geram queixas, e não queremos que ninguém se queixe
perto de nós, para não “perdermos tempo” os interesses alheios; porque
subentende pobreza, doença, tristeza, falta de realizações.
É necessário ter
necessidades. Precisar é tão preciso quanto viver não é preciso, parafraseando
Fernando Pessoa (1888-1935). A recusa de cooperar (operar junto), como se
pudéssemos nos livrar das necessidades, faz surgir outras necessidades que
podem nos ameaçar, inclusive, a saúde mental e a disposição geral em viver a
vida. Mas, alguém vive sem precisar de nada? Você já percebeu que sempre tem
alguém, em algum lugar do mundo, muitas vezes bem perto, que possui muito mais
do que você mesmo?
Como
afirma Sanford: “Ananke significa que existem repressões e limites interiores
que precisamos experimentar. Em nossa cultura atual, temos a tendência de
esquecer que existem limites legítimos que precisam ser observados” (p. 51).
Verifique: as necessidades,
efetivamente, supridas durante o ano de 2012, não foram aquelas que você mais
se envolveu? Desejo que você seja mais bem sucedido durante os dias de 2013, em
suas necessidades!
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