sábado, 21 de dezembro de 2013

Abaixo a teatralização do Natal

            Maria, uma jovem adolescente. José, um carpinteiro. Belém, cidade de Davi. Pastores de ovelhas. Reis do Oriente. Estrela. Manjedoura. Anjos. Estrebaria. Ouro. Incenso. Mirra.
            Algumas referências ao evento mais importante de uma das maiores religiões do mundo: “Um menino vos nasceu”, segundo a narrativa bíblica.
            Nada chama mais a atenção do mundo do que o nascimento de uma criança. Tudo para. Tudo fica em suspenso. E, no caso, se nada fosse tão extraordinário, ainda assim o Cristianismo teria a energia de atrair e aproximar as pessoas.
A criança mobiliza todos os sentimentos humanos. Basta observar uma casa onde acaba de chegar uma criança. Os pais ficam sem saber o que fazer durante algum tempo. A casa “vira de pernas pro ar”. Nada mais interessa a uma mãe, a não ser o seu rebento. Um colega, ao conduzir o primeiro filho para casa, passou na padaria e levou trinta pães, sendo que no dia anterior, como de costume, levara apenas quatro.
É uma pena que, na maioria das comemorações do Natal, suas representações se fixem na literalidade das personagens, ou dos fatos que o cercaram. Isto sinaliza uma limitação emocional quanto aos símbolos da Festa. Parece que não sabemos celebrar sem recorrer à teatralização, ou às músicas que repetem sempre a mesma coisa, sem falar da correria mercantil a que nos submetemos sem reflexão. O que está ocorrendo? Não somos capazes de imaginar os significados da data para os nossos dias?
A mensagem do Natal passa pelos nossos instintos mais profundos, até primitivos.
É preciso termos um ponto de referência fora da realidade marcada pelo excesso, pela ambição, pela indiferença, pela valorização do que se tem e não do que se é, se quisermos sentir que a vida tem algum sentido que vai além das coisas e das pessoas que nos cercam. Pois, afinal, assim nos conta a narrativa – “não havia lugar na estalagem”, por isso o Menino teve de nascer onde se recolhia os animais.
Celebrar o Natal, neste sentido, passa por um autoexame quanto às nossas reações, aos padrões de comportamento e de atitudes que tomamos frente às opiniões dos outros acerca do que nos acontece, seja em relação à família, aos negócios, à espiritualidade, aos amigos, etc.
Se não quisermos discordar de nós mesmos, daquilo que somos, temos de recorrer ao que se passa em nosso interior, pois “no mundo de fora” não é possível encontrar o apoio de que se necessita para tomar as melhores decisões; ainda que surjam represálias e humilhações, a essência de quem se é permanece preservada.
O dia nos chama a atenção para o valor da humildade que contrabalança com as comodidades da vida moderna, que acredita no poder das tecnologias, pois como nos é contado, Reis do Oriente e pastores de ovelhas foram ver o Menino.
De que forma podemos celebrar a humildade?
Se não é possível não acompanhar a evolução tecnológica (os Reis do Oriente), é preciso ter consciência de que possuímos instintos, um lado simples (os pastores de ovelhas), considerado tolo por alguns, como: a sexualidade, a fome, a reflexão, a criatividade, as atividades simples, conforme entendia C. G. Jung.
Refletindo, apenas em três deles: a fome nos faz lembrar da necessidade de autopreservação, especialmente quando a privacidade está sendo cada vez mais descartada depois do advento da internet. A criatividade é o que nos leva a buscar a melhorar o mundo. E, as atividades mais simples, como pintar, dançar, esculpir, viajar, escrever nos levam a manter vivo o gosto por mudanças no jogo diário da vida.

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