O cartunista argentino Quino, num dos
quadrinhos da perspicaz Mafalda instiga-nos a refletir, entre outras coisas,
sobre a alegria. Diante da TV ligada a pequena ouve: “Use!” “Compre!” “Beba!”
“Coma!” “Prove!” Questionadora, como sempre, Mafalda se pergunta: “O que eles
pensam que nós somos?” Emendando com: “E, o que nós somos?” E conclui: “Os
malditos sabem que nós ainda não sabemos!”
Mafalda
exemplifica a nossa condição frente ao jogo das propagandas. Estamos no
tabuleiro da onipresente, onipotente e “quase” onisciente publicidade das
lâminas de barbear, automóveis a cursos universitários – com a promessa de
satisfação que vai trazer ou de desconforto que vai nos ajudar a evitar,
gerando-nos um sentimento de insatisfação que nos parece tão inevitável quanto
insuperável.
Alegria é uma
das palavras de ordem dos nossos dias. O problema é que, na maioria das vezes,
um desejo satisfeito segue a muitos outros que nos deixam insatisfeitos. A
plenitude está sempre distante.
“Como evitar o
martelar constante da propaganda na vida moderna? Um bom primeiro passo é
reconhecer que ir atrás de coisas novas ou diferentes nunca satisfaz, e seu
contenta-mento é importante demais para ser perdido num ciclo interminável de
ganhar e gastar. [...] Como você provavelmente já percebeu, fazer mais do que
você já fez até agora não é a resposta. Mais bens de consumo, mais trabalho,
mais férias, mais amantes não levam a mais contentamento. O que você precisa é
desenvolver mais a consciência e a compreensão de si. O contentamento vem de
dentro. [...] O contentamento nunca é o resultado de fazer ou ter. O
contentamento é uma experiência interior”, afirmam Robert Johnson e Jerry Ruhl
(Contentamento. São Paulo: Mercuryo, 2000, p. 13, 25).
Ficamos
insatisfeitos à medida que atribuímos um valor especial a pessoas e a objetos
e, assim, transferimos um poder a eles, que na verdade, não existe.
Não se preocupe
como você gostaria que a sua vida estivesse, mas, sim, como ela está realmente.
Isto significa: respeitar a realidade. A alegria é do tamanho que você enfrenta
a vida com a realidade que se apresenta.
A pequena
Mafalda nos ensina isto. Mafalda conscientizou-se que precisava saber quem era
para não se deixar envolver por nada do que os outros lhe ofereciam.
Responsabilizou-se pela ignorância que a deixava ser explorada pelos outros.
Conscientizou-se que não há ninguém para salvá-la, ninguém para adorar, ninguém
para providenciar sua alegria de viver. Assumiu cuidar do seu mundo interior,
porque agora sabe que sua alegria não está “lá fora”. Mafalda assumiu suas
próprias projeções.
Ser alegre está
mais em ser do que em ter; ter mais, poder mais. Mafalda conscientizou-se que
estava diante de uma grande oportunidade de mudança de vida – para isso, suas
pretensões não serviam mais. Alegria é sentir quem se é, nem mais, nem menos.
“Procurar ser qualquer coisa além do que você é é uma distorção da realidade”
(idem, p. 53).
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