Há
um desejo inato, nos seres humanos, de mudar a realidade social e política.
Este potencial
pode ser estimulado ou reprimido. E, sempre desbloqueado!
Se reprimido,
para onde vai a energia política?
Para muitos,
pode ser que se dirija para a esperança que apareça um líder heróico para
conduzir o País às transformações. Entretanto, a confiança numa liderança que
encarna a função de herói gera uma população passiva e uma elite sedenta de
poder.
A passividade da
população frente aos líderes que aceitam o papel de herói provoca, pelo menos, dois
problemas: 1. impede a aprender com os erros, mesmo diante de muitos prejuízos
sociais, econômicos e políticos; 2. só estimula a velha prática de buscar os
culpados.
Como eleitores é
nossa responsabilidade deixar de lado o cinismo e o “complexo de vira-lata”,
como entendia o dramaturgo Nelson Rodrigues (1912-1980): “o brasileiro é um
narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos
pretextos pessoais ou históricos para a autoestima” (À sombra das chuteiras:
crônicas de futebol. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 51).
Diante dos
desafios que a nossa sociedade tem pela frente, não podem ser vencidos com
cinismo e fraca autoestima.
Concordo com a
reflexão do britânico Andrew Samuels (1949-), psicólogo junguiano e consultor
político: “Para alterar as nossas ideias sobre os líderes também significa
alterar as nossas idéias sobre nós mesmos como cidadãos. Muito tem sido escrito sobre a apatia
(passividade) recentemente. Mas
há um sentido em que o problema é muito maior do que podemos imaginar:
aspiramos, acreditamos em soluções perfeitas – que leva, inevitavelmente, à
decepção com a política e à repressão do potencial político de cada um de nós. O que parece ser apatia é na verdade um
difuso sentimento de impotência, muitas vezes associada a uma intensa autocrítica.
Sentindo que não podemos alcançar tudo aquilo que sabemos que precisa ser feito
– que não temos nem o poder, nem as habilidades necessárias para resolver os
problemas assustadores de pobreza, injustiça, espoliação do meio ambiente – desistimos
da política, recuamos em nossas vidas privadas (deixando nossas aspirações e
valores políticos suspensos) e não fazemos nada. Se pudermos aceitar que a
perfeição política e dos políticos é inatingível, se perguntarmos a nós mesmos
apenas se somos suficientemente bons cidadãos (assim como só podemos esperar
líderes suficientemente bons), podemos ser libertos da sensação de desespero
que nos paralisa no presente, de modo que nossas esperanças políticas e
impulsos possam despertar” (www.andrewsamuels.com).
Se
o potencial da energia política de muitos brasileiros está reprimido, é
possível desbloqueá-lo, e os movimentos sociais que ganharam as ruas e praças
em nosso País, em junho passado, são nossas maiores referências, mesmo que nos
pareçam demasiadamente agressivas. Entretanto, é bom levar em conta, aquilo que
o mesmo Andrew Samuels, nos adverte, em outro lugar: “Podemos chegar a ver a
agressão como um impulso politicamente reparador, compreendendo que a agressão
incorpora frequentemente não apenas intensos desejos de relacionamento, mas
desejos igualmente intensos de participação numa atividade política ou social.
Ser autenticamente agressivo, raivoso, e ainda ser capaz de fazer parte de
processos sociais e políticos, é uma meta psicológica e ética da mais alta
ordem” (A psique política. Rio de Janeiro: Imago, 1995, p. 79).
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