domingo, 10 de março de 2013

Do apogeu ao hipogeu


Refiro-me aos adjetivos: apogeu - algo que alcança a culminância, o auge, o mais alto grau; hipogeu - ao que é situado debaixo da terra ou no nível do chão, subterrâneo, conforme Houaiss.
            A dinâmica da vida humana se dá entre estes dois polos. Neste sentido, somos bipolares. Como numa gangorra, ora estamos no alto, ora no chão.
Basta uma crise, qualquer crise, para que a oscilação aconteça. Crise social, financeira, política, moral, física, econômica, psicológica, organizacional, institucional, cultural, afetiva e religiosa para que se levantem dúvidas sobre quais fundamentos a relação social, financeira, política, moral, física, econômica, psicológica, organizacional, institucional, cultural, afetiva e religiosa se baseava, gerando uma generalizada desconfiança nos vínculos que até então eram mantidos. Parece que nem o amor sobrevive a elas. As crises fazem com que tudo e todos passem por esta experiência. A rotina é que tudo está em movimento. Não é possível manter tudo e todos em equilíbrio. É preciso manter-se vivo no movimento oscilante.
Nas palavras do sociólogo Michel Maffesoli (1944-), professor da Universidade Paris Descartes e pesquisador do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França, nossos dias se caracterizam por um “apocalipse”, no estrito sentido do termo, revelação (Saturação. São Paulo: Iluminuras: Itaú Cultural, 2010).
As crises revelam-nos. Põem às claras o que estava oculto. E, a isto devemos estar atentos, para enxergar. “Podem ser os arquétipos de C. G. Jung, os resíduos de Vilfredo Pareto, as estruturas de Lévi-Strauss, os fatos sociais de Durkheim, pouco importam as noções, basta que se preste atenção aos subterrâneos que servem de fundações para toda a vida social” (p. 23).
Se já vivemos num tempo durante o qual as adaptações não eram necessárias, apesar das contínuas crises, mas ofuscadas por certa ingenuidade, até podíamos nos dar ao luxo de desprezá-las, atualmente, entretanto, as tentativas de manter este estado de coisas, é suicídio ou perder-se nos caminhos que a história indica.
A sobrevivência às crises passa por uma atitude de conciliar os opostos, Prometeu e Dionísio, lembra Maffesoli. Um não desaparece quando o outro está em cena, mas espera por sua vez. O fogo distribuído aos homens não se apaga com as trevas, mas mantém a vida aquecida, apesar de nos parecer que temos brasas, somente, e que estamos às escuras.
Os últimos dias nos deram uma visão ampla desta verdade: a renúncia do Papa e as intrigas políticas e espirituais da religião do Ocidente, bem as dúvidas que pairam quanto ao futuro no mundo; a saída de cena política mundial do caudilho venezuelano; a morte, por overdose, de um dos jovens mais influentes na cena artística brasileira; a votação tumultuada, pelas credenciais indecentes de um líder religioso evangélico, para uma das mais importantes comissões de trabalho do Congresso Nacional; as dificuldades econômicas, cada vez mais crescentes, da Europa e Brasil; as dúvidas da permanência ou não do chefe do executivo mariliense; entre outros.
Saída? Para Maffesoli: é preciso, cada vez mais, se “envolver” com tudo, desde os movimentos ecológicos até a arte do design, para acompanhar o movimento perene do apogeu e hipogeu da nossa vida particular e universal. É preciso recuperar o lugar do “imaginário, do poder espiritual, o retorno vigoroso da cultura, o prevalecimento do imaterial, a presença do invisível” (p. 29).

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