segunda-feira, 30 de abril de 2012

Manipulação política


Buscamos controlar o mundo ao nosso redor. Não existe quem não deseja dominar as realidades que vive. Até o bebê manipula a mãe pelo choro, a fim de ter as suas necessidades atendidas.
            Somos capazes de manipular grupos de pessoas, cidades, indivíduos e a natureza. O problema é que nem sempre as consequências são positivas: grupos se massificam; cidades, mal administradas; mulheres, escravizadas pelo sentido único da beleza física; crianças são negligenciadas em seus direitos; negros, desprezados por uma simples razão genética; e o ecossistema, explorado à exaustão de seus recursos.
            Nisto nos deparamos com o outro lado da verdadeira face humana, ou seja, de que não somos perfeitos e/ou bons – somos seres violentos, ausentes, desonestos, corruptos, alheios a si mesmos e ao próximo.
            Esta situação nos traz uma questão: o homem é capaz de mudar? Até que ponto eu e você somos capazes de alterar a nossa maneira de domínio?
            A resposta pode ser sim e pode ser não. Depende da apreensão que cada um faz da realidade com que se depara. Isto é, como você e eu internalizamos o mundo que nos rodeia. O que cada um de nós internalizou é crucial para determinar a resposta.
            O que você apreende acerca dos grupos a que pertence, ou que conhece; da cidade onde mora; das mulheres com quem vive; das crianças da sua família, dos vizinhos e dos outros; dos negros; e da natureza que você ocupa?
            A relação que temos com estas categorias existenciais, a partir do que apreendemos delas, determina até que ponto as manipulamos.
            No campo político é disto, principalmente, que as alianças político-partidárias estão tratando em suas reuniões, e não apenas em como vencer aos pleitos eleitorais.
            É verdade que muitos a esta altura das convenções e definições dos partidos políticos estão à procura de ações imediatistas, porque estão seduzidos pela resposta que dão ao seu poder de manipular situações que envolvem a todos e a tudo.
            Os eleitores precisam perceber que os candidatos já estão manipulando pessoas (familiares) e grupos (partidos) no processo de efetivação de suas indicações, e durante a campanha eleitoral manifestarão publicamente como pretendem dominar as situações a que estão e/ou estarão submetidos, caso sejam eleitos, ou seja, até onde pode ir o seu poder de manipular a realidade em seus cargos e funções?
            Os melhores candidatos são aqueles que admitem que o que está em jogo é a sua resposta a estas questões: qual o valor que tenho internalizado acerca das mulheres, das crianças, do ecossistema, dos negros, dos jovens desempregados, dos homossexuais, das prostitutas, do empresário que retém por fraude o salário de seus funcionários, da elite que faz exigências do poder público em troca de favores que significam prejuízo social, principalmente dos menos favorecidos?
            A resposta a estas e outras questões determinará que tipo de ação política pode ser esperada, e certamente será empreendida pelos eleitos, conforme o que têm internalizado a respeito das várias situações da vida.

Agressividade na escola


Segundo Jean Piaget (1896-1980), pai da teoria psicogenética, a inteligência não é herdada, mas construída na interação dos indivíduos em seu contexto físico e social, isto é, o conhecimento intelectual se desenvolve em bases afetivas. Cognição e afeto são faces de uma mesma moeda. Uma não subsiste sem a outra.
Para uma criança assimilar os conteúdos escolares, não é suficiente fazer uma avaliação de sua capacidade intelectual. Variados mecanismos psicopedagógicos cumprem esta tarefa, na maioria das vezes, a contento. Faz-se necessário um acompanhamento da capacidade afetiva de todas as pessoas envolvidas no processo de ensino e aprendizagem junto da criança, não somente dela, mas de seus pais, professores, funcionários da escola, bem como de toda a sociedade.
            Sentindo a onipresença do problema da agressividade na vida de muitas crianças, adolescentes e jovens em seus lares e escolas, a seguinte carta registra as dificuldades de um aluno em seu processo de aprendizagem:
Pai, eu tenho muita vontade de me aproximar dos meus colegas da Escola, mas não sei o que acontece comigo que não consigo. Quando estou perto deles, sinto vontade de bater neles. Será que este problema não está em nossa casa?
            Sabe pai, acho que sou impulsivo demais nas minhas atitudes porque não recebo carinho, como eu gostaria e preciso. Eu não sei, mas pode ser que eu esteja assistindo algum tipo de violência, física ou emocional, aqui em casa e não poderia, não é mesmo?
Certo dia, ouvi o professor falando que sou agressivo com os meus colegas, porque o senhor não impõe limites, ou é muito tolerante quando eu faço o que não deveria fazer, não entendi muito bem, mas se for isto, só o senhor pode resolver esta situação. Mas, pode ser também, porque não sei “perder”, não tolero ser frustrado em minhas intenções.
            Pai, eu quero e preciso do seu apoio para resolver esta situação, além do da Escola. Pode ser que eu esteja, simplesmente, reproduzindo um comportamento que estou vendo em casa e/ou na escola, mas eu quero e preciso de ajuda, de você e da escola, para mudar este meu jeito de ser. Pai, a agressividade não é a melhor maneira de resolver os problemas, ela não é normal; ela só piora as situações, inclusive me atrapalha em aprender as matérias na Escola. Eu posso e quero ser uma criança calma, e para que isto aconteça eu preciso de ajuda.
            Pai, eu sei que com cooperação, amizade e diálogo este problema pode ser solucionado, por isso estou conversando com o senhor sobre isto. Não, o professor não está com “marcação” em cima de mim, porque outros colegas com a mesma dificuldade estão encaminhando a mesma cartinha para os pais deles.
            O professor disse que eu tenho muitas qualidades positivas: sou uma criança inteligente, curiosa, asseada, que eu consigo comandar os meus colegas nas atividades em sala de aula, e muitas outras coisas.
            Mas pai, eu não consigo evitar os conflitos, nem resolvê-los sem ser agressivo.
            Sei que com a sua ajuda e com a da escola posso aprender a melhorar como pessoa e aprender muitas coisas necessárias com o meu professor.
            Por favor, me ajude. Seu filho.

terça-feira, 17 de abril de 2012

Idealização e frustração na política


        Partidos políticos procuram pessoas que possam vencer as eleições, para verem seus interesses implantados na vida real dos cidadãos.
Candidatos procuram afinar seus discursos às necessidades dos eleitores para conquistarem o maior número de votos, com a intenção de serem líderes da sociedade.
            E, o eleitor aguarda as propostas de cada partido e candidato para escolher o seu representante, e acompanhar o exercício do mandato.
            Partidos, candidatos e eleitores têm expectativas quanto à solução dos problemas da cidade, e quanto ao futuro da sua administração.
            Entretanto, muitas expectativas podem não ser correspondentes à realidade, porque são idealizações, exigindo de todos, um alto nível emocional para a frustração.
            Quanto menor a capacidade de suportar frustrações, maiores serão as promessas dos partidos políticos e de seus candidatos, e menor a participação dos eleitores na ação política e na transformação da sociedade.
            Temos de estar preparados para os fracassos, mesmo porque, temos uma larga e antiga experiência no contexto nacional, e em nossa cidade.
            A frustração é parte integrante de nossa vida política, assim como a idealização, contudo é preciso estarmos conscientes disso para que os efeitos da decepção sejam sentidos como desafios para a sociedade democrática e mais justa que tanto queremos.
            “Se nosso objetivo é a perfeição, estamos condenados a cair no desespero e na depressão; sentimo-nos impotentes e não conseguimos agir. Se apenas observamos como as coisas são terríveis, ficamos tentados a lavar as mãos da política e deixar que os outros (os líderes) tratem das coisas; ficamos paralisados e, mais uma vez, perdemos nosso sentido de atuação” (A política no divã: cidadania e vida interior. São Paulo: Summus, 2002, p. 95).
            Nenhum dos candidatos é capaz de carregar o ideal dos eleitores. Ninguém suporta por muito tempo o papel de herói ou heroína, sem sofrer o desgaste físico, mental e psicológico à que se impõe. Em algum momento romper-se-á a verdadeira natureza humana.
            Simplesmente, em política, precisamos de pessoas não-heróicas, que dependem de admiradores – ou seriam bajuladores? – mas, de pessoas que possam dar o melhor de si para o bem-estar da maioria, e que mudem sua maneira de pensar quando está em jogo a vontade do povo, e seus interesses pessoais.
            É inevitável que a sociedade se decepcione com os fracassos dos políticos, não só devido à complexidade dos problemas que nos afligem, mas principalmente, devido à sua natureza humana.
            Partidos e candidatos precisam perceber que os problemas da cidade não são fáceis, e que como humanos, são altamente deficientes e passíveis de fracassos, mesmo quando são bem intencionados.
            E, os eleitores conscientes disto, saberão não se deixar enganar por promessas que para serem cumpridas, políticos e partidos farão qualquer coisa, mesmo que violentem suas boas intenções, deixando à mostra sua natureza humana, tão limitada e decepcionante.

domingo, 8 de abril de 2012

Onde está a política?


            Na opinião do inglês Andrew Samuels, psicólogo e consultor político, inclusive para o Brasil, a psicologia se dirige por uma linguagem do mundo interior, enquanto que a política fala a partir do mundo exterior, contudo, é necessário ocupar uma posição híbrida entre estes dois mundos, que surge a partir do confronto entre eles (A política no divã: cidadania e vida interior. São Paulo: Summus, 2002). O confronto é um exercício frequente com a contemporaneidade, ainda que vivamos numa época “líquida” como afirma o sociólogo polonês Zygmunt Bauman (1925-).
            Pode ser que hoje, mais do que nunca, devido a crescente revolta que o sistema político tem provocado nas pessoas, porque parece ser incapaz de resolver os problemas da nossa sociedade e se ocupar com as lutas pelo poder e o controle de recursos, a voz da psicologia precisa ser ouvida.
            Inicialmente, quanto a questão da liderança política.
Quanto mais carismático for o líder, mais votos é capaz de trazer ao partido e ganhar uma eleição. Mas, não basta ser popular; melhor se se apresentar como um herói, quase um “messias”, um “salvador”, que tem “a” solução perfeita dos problemas.
A esperança por um “libertador” é compartilhada tanto pela elite, como pela população em geral. Este anseio estimula o sentimento de autocomiseração, isto é, transfere para a figura de alguém todas as responsabilidades, de quem devem ser cobradas, e intimida a inteligência. A elite sabe pressionar, às vezes, com um custo enorme de energia emocional de seus representantes, mas o povo, quase sempre, nem conhece os seus direitos. Há de se reconhecer, portanto, a existência de uma relação psicológica entre políticos e cidadãos, e que precisa ser alterada.
“Temos de aceitar a ideia de que nossos líderes inevitavelmente nos decepcionam pelo menos por algum tempo, e que a liderança é, em certo sentido, a arte de gerenciar o fracasso. Para alterar as nossas ideias sobre os líderes, também significa alterar as nossas ideias sobre nós mesmos como cidadãos” (Andrew Samuels, em: The Times Higher Education Supplement, 2001).
É preciso admitir que a sensação de abandono, de desapontamento relatado pelo povo em seus comentários acerca da cena política, é própria de uma atitude infantil diante da vida, fruto da recusa de assumir sua parte no processo político-administrativo da cidade; mas, igualmente infantil, é o cinismo, a presunção e a arrogância que sustentam a elite. Não é à toa que os sentimentos de raiva e agressão ocupam destacado papel nas relações sociais.
A sociedade precisa reconhecer que a política, como energia que move o mundo na solução de seus graves problemas, não está mais em suas tradicionais instituições, como grandes partidos e líderes políticos carismáticos, mas sim, em movimentos sociais que lutam por causas suprapartidárias, humanitárias, como tentativa de regastar um senso de decência, e sentido à vida no mundo.
Neste Domingo da Ressurreição, nos lembramos das palavras do Anjo que anunciou aos que buscavam pelo corpo de Jesus Cristo no sepulcro em Jerusalém: “Ele não está aqui, mas ressuscitou”.
Semelhantemente, a energia política continua viva, e é possível encontrá-la.

domingo, 1 de abril de 2012

A cidade em nosso imaginário


              “Onde você estava com a cabeça?” “Por que não pensei nisto antes?”
            É muito comum ouvirmos ou falarmos estas frases quando as ações são reprováveis, negativas, ou quando se soluciona algum problema que há muito nos afligia.
            Entretanto, na verdade, isto acontece graças a nossa capacidade de imaginar como seria a realidade se agíssemos desta ou daquela maneira. São “pensamentos” ou “ideias” que nos surgem “do nada”, e quando executadas podem resultar situações boas ou ruins. Imaginar não é uma atividade racional, não segue parâmetros rígidos da lógica.
A imaginação é a maneira humana de alterar a realidade quando buscamos melhores maneiras de enfrentá-la. Somente os humanos têm esta capacidade. De onde vêm todas as formas de arte: música, pintura, teatro, cinema, literatura, etc?  E, as ideologias, os valores morais e éticos, as religiões? Os animais não produzem nada disso. Sem imaginação não haveria cultura.
            Imaginação não é ilusão. Ilusão é ter uma percepção distorcida da realidade; enganar a outros ou a si mesmo. Imaginação é a capacidade de representar ou externar, e acrescentar o que sentimos em nosso mundo interior a realidade externa.
            Para o teólogo, educador, escritor e psicanalista mineiro Rubem Alves (1933-) a imaginação é “a origem da criatividade humana” (O enigma da religião. Petrópolis: Vozes, 1975, p. 15).
            Quando imaginamos somos capazes de encontrar significados nos fatos que nos acontecem. É a imaginação que nos capacita a enfrentarmos os fracassos, as frustrações, os trabalhos e as lutas de cada dia.
A imaginação não é para tornar a vida mais fácil, mas para refletirmos melhor quanto às dificuldades que nos surgem.
Quando imaginamos somos capazes de produzir beleza, rir de nossos erros, encontrar tranquilidade e conforto diante das dificuldades, sonhar e construir uma sociedade melhor de se viver. Parafraseando o filósofo francês René Descartes (1596-1650), podemos afirmar: “Imagino, logo existo!”
            Neste 83º aniversário de nossa cidade, somos chamados a transcender a realidade que nos impõe limites. Não podemos adaptar ou ajustar a vida política e administrativa às possibilidades que nos são apresentadas. Precisamos “suspeitar” de que é possível irmos além, de que sempre haverá alguma coisa faltando, e buscá-la, acrescentando-a a realidade. “A imaginação é a consciência de uma ausência, a saudade daquilo que ainda não é, a declaração de amor pelas coisas que ainda não nasceram. A imaginação dissolve a realidade que a resiste, e traz à existência aquilo que não existe. A função da imaginação é realizar o irrealizável, possibilitar o impossível” (Rubem Alves).
            É preciso, e o melhor, é possível construir uma cidade diferente. O que estamos dizendo acerca de nós mesmos através daquilo que imaginamos para a nossa cidade? Como imaginamos a nossa cidade? Quais são as emoções que nutrimos a respeito de suas necessidades e infinitas possibilidades?
            O imaginário é mais do que uma técnica para melhorar a cidade, é um compromisso com a ética que temos com nós mesmos, e com os futuros marilienses.