quarta-feira, 10 de abril de 2013

O problema da cidade sou eu


          Temos muitos problemas, por vivermos na cidade: ruas esburacadas e mal sinalizadas; a sujeira e abandono das praças e vias públicas; a alta do custo de vida; o abuso das instituições políticas, jurídicas, policiais, financeiras e econômicas; a falta de segurança; o desemprego; o processo de crescimento desordenado da cidade, que estabelece verdadeiras castas de privilegiados e de miseráveis; o mau uso, o desperdício e a falta de água em nossas casas; a precariedade das condições e o mau atendimento à saúde, principalmente, de crianças e idosos; a elevação e a cobrança injustas de taxas e impostos; a baixa qualidade do ensino em nossas escolas; a onipresença de festas, regadas a bebidas e drogas, em cada canto da cidade; o superfaturamento de obras públicas e de infraestrutura; o discurso vazio ou hipócrita das autoridades civis, militares e religiosas, pois acreditam que o “povo” não tem percepção intelectual, e não duvida que mintam; o desrespeito aos professores das redes pública e privada; o endividamento do município, com a definitiva perda de sua autonomia na definição do uso da sua arrecadação; o descompromisso para com um trânsito mais humanizado, movido pela exibição de carros luxuosos e velozes, e pelo desrespeito para com os pedestres e outros motoristas, cujos carros são mais antigos ou menos potentes; a desconfiança de que existem pessoas honestas e sinceras em suas atividades e atitudes; a convicção firme e segura de que as pessoas não podem mudar de opinião, reparar os erros, restaurar e estabelecer antigas e novas relações, até mesmo para com aqueles que os ofenderam, ou de baixo padrão moral; a desarticulação de ideias e ideais comunitários, o que permite a criação e o fortalecimento de interesses pessoais; a dissimulação de sentimentos, legítimos, como a raiva e a depressão, por temermos os efeitos da opinião alheia; a certeza de que os problemas coletivos devam ser resolvidos, exclusivamente, pelas autoridades e, principalmente, de que não temos nenhuma contribuição em solucioná-los; a falta de percepção de que precisamos encontrar caminhos melhores entre o cinismo e a ingenuidade; a necessidade, por parte de muitos, de excluir as mulheres, os negros, os homossexuais, os idosos, as crianças, os pobres - assim como faziam, desde tempos memorais, com os judeus e prostitutas, mas motivada pelo mesmo medo projetado sobre os outros, e sempre movida por uma mente que se define por aquilo que odeia - do debate democrático que pode levar-nos a uma sociedade que diminui as desigualdades; a certeza de que o “destino” dirige nossas vidas, e por isso, não podemos alterar a realidade, sem perceber nesta atitude, um alto nível de alienação mental, espiritual, psicológica, política, com graves prejuízos às futuras gerações; submissão em acreditar piamente, nas ilusões que criamos acerca do ideal de cidade que gostaríamos de viver, num desejo, inconfessado, de fugir da verdade real que nos rodeia, pois se assim o fizéssemos seríamos forçados a reconhecer a nossa participação, nestes e em muitos outros problemas, de que ao enfrentá-los, nos encontraremos com nós mesmos.
            É preciso reconhecer como o norte americano, ativista político e teórico em inovação e previsão tecnológica Fran Peavey (1941-): “Percebo meu apego a um padrão de vida que é mantido à custa de pessoas mais pobres. (...) E, o problema da poluição parece incluir o meu consumo de recursos e a minha produção de resíduos. A linha que me separa dos “bandidos” é indistinta” (Zweig e Abrams (Orgs.) Ao encontro da sombra. São Paulo: Cultrix, 2012, p. 224).

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