sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O meu problema sou eu. O seu problema é você


            Negamos nossas necessidades, e por isso dogmatizamos os problemas que nos surgem. Estamos convictamente convencidos de que as situações ligadas à política, meio ambiente, cultura, saúde, direito, religião, economia e às relações interpessoais são os nossos reais problemas. Queremos, a todo o momento, saber o que aconteceu de errado, o que houve para a situação se complicar. E, não faltam aqueles que se consideram “especialistas” em problemas.
Segundo James Hillman (Uma busca interior em psicologia e religião. São Paulo: Paulinas, 1984), criador da psicologia arquetípica, morto no último dia 27 de Outubro, isto se deve ao ideal protestante ocidental que busca a plena e irrestrita independência do “eu” frente a todas as realidades que o cercam, por não admitir a ideia de que o homem é um ser dependente, fraco e que deve submissão a outros. Contudo, na opinião do psiquiatra suíço Carl Gustav Jung (1875-1961), se o protestante deseja contribuir para a melhoria do mundo, mesmo sem a rigidez dogmática e a ausência de rituais que facilitam a convivência com o outro, ele precisa: “descobrir coisas até então inconscientes, [...] perceber as forças impessoais que se ocultam em seu interior” (Psicologia e religião. Petrópolis: Vozes, 1990, p. 54).
Ao considerar que os problemas estão fora de mim e que preciso resolvê-los, permaneço inconsciente acerca de mim mesmo, isto é, vivo como se tivesse poder de tirar o “cisco do olho alheio, sem perceber a trave que existe no meu”, conforme o ensino das Escrituras Sagradas.
Na realidade, nosso problema somos nós mesmos. O meu problema sou eu. O seu problema é você. Nossos problemas revelam quem somos. Negamos energicamente esta realidade, porém nos submetemos a eles como se fossem exigências. Muitos deles não precisavam se tornar realidades, mas quando tomam a forma real, a solução está em resolvermos a nós mesmos.
Jung, em outro lugar afirma: “A vida não vem das coisas, mas de nós” (O livro vermelho. Petrópolis: Vozes, 2010, p. 239).
            A verdadeira dimensão da vida está em nós, e não em nossas capacidades de compra, inteligência ou esperteza em nos enganarmos a nós mesmos e aos outros.
“Tu queres fugir de ti, para não teres de viver aquilo que não foi vivido até agora. Mas não podes fugir de ti mesmo. Isto está todo o tempo contigo e exige realização. Se te colocares cega e surdamente esta exigência, tu de colocarás cega e surdamente contra ti mesmo. Então jamais alcançarás o saber do coração. O saber do coração é como teu coração é. De um coração mau, conheces coisas más. De um coração bom, conheces coisas boas. Para que vosso conhecimento seja completo, considerai que vosso coração é ambos: bom e mau” (O livro vermelho. p. 233-234).
Precisamos “realizar” a nós mesmos, ou seja, ver e ouvir o que realmente somos interiormente, se quisermos adquirir alguma sabedoria na administração daquilo que existe no exterior que nos rodeia.
Ainda no Livro Vermelho (p. 235), Jung nos lembra da fábula do “santo que, ao sentir nojo dos doentes da peste, tomava o pus de suas feridas e notava que tinha um odor como o das rosas”. Precisamos resistir a tentação de atribuir às contingências a razão de nossa infelicidade.

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