sábado, 1 de junho de 2013

A importância psicológica da Comissão da Verdade

          A Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada pela Lei nº 12528/2011, e instituída em 16/05/12, tem estimulado a muitas pessoas e seus familiares a relatarem, na maioria das vezes com muita emoção, os sofrimentos experimentados durante os anos de ditadura militar entre os anos 1946-1988. Exemplo: depoimentos da cineasta Lúcia Murat, e da historiadora Dulce Pandolfi. (Vale conferir em: http://www.territorioeldorado.limao.com.br/noticias/not269194.shtm).
Segundo John R. van Eenwyk, da Universidade de Medicina de Washington e diretor do International Trauma Treatment Program (ITTP): “O principal objetivo da tortura é perturbar, senão destruir a continuidade da vida (entes queridos foram mortos, culturas destruídas, relacionamentos danificados, meios de subsistência eliminados), a tal ponto que a remediação ou é extremamente cara (em termos financeiros, de tempo e esforços), ou simplesmente, impossível. A tortura, efetivamente, elimina qualquer vestígio de confiança que existe nos sobreviventes, em sua capacidade de controlar os impulsos da vida” (http://www.cgjungpage.org/index2.php?option=com_content&task view&id=183&pop=1&page=0&Itemid=40).
É importante, para o bem-estar psicossocial do País, considerar que o trabalho da CNV é uma tentativa de restabelecer as pontes político-sociais destruídas pela força do Estado contra milhares de cidadãos, como oportunidade de a psique/alma nacional estabelecer símbolos de compensação contra as atrocidades cometidas em nome da lei e/ou dos que comandavam as ações de repressão. Quer dizer: o legado da CNV será um símbolo a mais para que tais práticas NUNCA MAIS encontrem lugar em nossa, tão nova quanto sofrida, democracia.
Enquanto a consciência procurava se adaptar à vida como se nada tivesse acontecido, o inconsciente aguardava o momento mais propício - e nunca é tarde demais para rever e reaver a história - para revelar o que muitos buscavam esquecer ou que, simplesmente, fosse esquecido. E, isto aconteceu, por que: “O inconsciente contém todas as combinações de fantasia que ainda não ultrapassaram o limiar de intensidade, mas que, com o decorrer do tempo e em circunstâncias favoráveis, entrarão no campo luminoso da consciência”, de acordo com C. G. Jung (1875-1961), em A natureza da psique (Petrópolis: Vozes, 2000, p. 1).
A psique/alma busca autorregular-se aos acontecimentos externos, e vice-versa, diante das dificuldades que nos surgem, graças à capacidade irreprimível de fantasiar, ou seja, de imaginar ativamente como a vida pode melhorar, com o propósito de evitar males maiores como a depressão, ressentimentos, desprezo pela criatividade, permanência na baixeza da natureza humana, ansiedade, medo, culpa, perda de uma espiritualidade viva e que oferece sentido à vida, desenvolvimento da energia vital, afetos extremados, como a violência, por exemplo. Mais uma vez, conforme Jung: “A psique não apenas reage, ela dá sua resposta própria às influências que atuam sobre ela” (Freud e psicanálise. Petrópolis: Vozes, 1989, p. 278).

Tanto os sobreviventes quanto os agentes da repressão, e/ou familiares de ambos, à maneira de cada um, têm reagido emocionalmente aos terrores sofridos e perpetrados. Aqueles pela humilhação sofrida resgatando a autoestima, os outros pelo reconhecimento de terem participado em atos de violência contra os direitos humanos, em sinal de autocrítica visando a integração do lado sombrio da sua psique.

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