quarta-feira, 17 de julho de 2013

Vivendo como Curupira

         A formação do povo brasileiro tem a marca da mutilação verificada em nossa mitologia - Saci, Curupira e Mula-sem-cabeça - conforme a psicóloga analítica Dulce Helena Rizzardo Briza (A mutilação da alma brasileira: um estudo arquetípico. São Paulo: Vetor, 2006).
            Temos considerado tais mitos como imagens presentes em nossos sonhos, durante o tempo em que adormecíamos, como o Gigante “deitado em berço esplêndido”. Figuras teogônicas do imaginário, reinantes nas florestas, lembradas de norte a sul do País, e narradas oral e literariamente não só por autores nacionais, como também, estrangeiros.
O que nos interessa é que não inventamos mitos, mas os experimentamos diariamente na lida diária como nação brasileira. Não se trata de uma imagem pessoal, de alguém ou de algumas pessoas especificamente, mas que nos expressamos psiquicamente, como eles são descritos, coletivamente. Nossa vida psíquica é dominada por estes mitos, aqui expostos devido à mutilação comum a eles, e por isso, reativam fatores em nossas almas, em sua maioria, inconscientes, que interferem na construção de um País melhor. Contudo, algo importante devemos refletir: temos de aproveitar os acontecimentos que resultam de nossa inconsciência e que impedem avançarmos numa agenda mais positiva, para que os transformemos em experiências que ampliem nossa consciência pessoal e coletiva, facultando a descoberta de novas possibilidades no enfrentamento dos mesmos.
Conforme Samuels: “Contos míticos ilustram o que acontece quando um arquétipo tem a rédea livre e não existe intervenção consciente da parte do homem. Contrastando com isso, a individualidade consiste no confronto e diálogo com tais poderes fatídicos, reconhecendo sua força primeva, mas sem submissão a ela” (Dicionário crítico de análise junguiana. Rio de Janeiro: Imago, 1988, p. 128).
            Quanto ao Curupira: “As tradições representam-no como um pequeno tapuia com os pés virados pra trás, e sem os orifícios necessários para as secreções indispensáveis à vida” (O Selvagem, Couto de Magalhães, 1876, pp. 138-139, citado por L. C. Cascudo, Geografia dos mitos brasileiros. Rio de Janeiro: José Olympio, 1947, p. 120).
            Segundo Briza: “Aqui nos deparamos com o andar que dissimula, desorienta, que também pode ser entendido como mecanismo de defesa” (A mutilação..., p. 127).
Precisamos reconhecer, que temos nos revelado hábeis criadores de disfarces em muitas questões da vida nacional. São muitas as provas que o Curupira está vivo, porque o vivemos em nossos lares, nas ruas, no trabalho, nas arenas políticas, sociais, culturais, econômicas e espirituais sem uma “intervenção consciente”, mas descarada e “submissamente”.
Não é possível esconder por muito tempo, sem que as consequências apareçam, um contexto marcado por artifícios montados, pois, fatos ou pessoas trazem à tona seja pela conduta ou por comportamentos não-verbais o que se tentam esconder.

Atenção governantes: os cidadãos não aguentam mais dados sociais e econômicos mascarados, discursos que não correspondem às duras e cruas realidades das ruas, blefes políticos e políticos blefes, compromissos ocultos. Antes, queremos: transparência já, clareza nas opiniões e posições, desmascaramento das articulações, etc.

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