segunda-feira, 24 de março de 2014

A "voz" da consciência

Dentro de nós há uma voz insistente e calma que chamamos “consciência”. Percebemo-la, especialmente, em situações que nos vemos obrigados a sacrificar nossas vontades e impulsos pessoais. Portanto, não me refiro à experiência do conhecer, mas ao superego, referido na teoria psicanalítica.
            A “voz” da consciência, às vezes, surge de modo ostensivo não deixando nenhuma dúvida quanto à melhor postura a tomar diante de uma determinada situação, outras vezes, não tão definida, manifesta-se sutilmente deixando-nos em dúvida.
A consciência é o fator psicológico que nos leva a sentir que existe um “outro” interno que faz exigências quanto a nós mesmos frente às questões ligadas ao sexo, ao poder, ao dinheiro, à política, ao que comemos e bebemos, aos estudos, aos comportamentos sociais e relacionamentos, por exemplo, e aos outros ao nosso redor.
“Pesada” para alguns, graças à ansiedade e ao sentimento de culpa, quando alguma “regra” social é infringida; “leve”, aos que se sentem cumpridores dos “deveres” sociais; “problema” e causadora de “dor” a outros, em caso de violação aos padrões coletivos considerados “certos”. Consideramos “sem consciência”: estupradores, assassinos, corruptos, pedófilos, torturadores, etc.
Conforme o analista de treinamento no Instituto C. G. Jung de Chicago (EUA), Murray Stein, a consciência nos leva a tornar abstratas todas as coisas e, experimentamos uma espécie de “iluminação moral”, isto é, nos sentimos capazes de desenvolver “um profundo e apaixonado compromisso com os valores abstratos que subjazem a uma tradição cultural ou religiosa em especial”, que passa a ser defendido como “a voz de Deus” (Consciência Solar, Consciência Lunar: Ensaio sobre os fundamentos psicológicos da moralidade, da legalidade e da noção de justiça. São Paulo: Paulus, 1998, p. 44).
Segundo Stein, isto pode resultar em algumas atitudes: 1) compreender os valores, as leis, as regras e os costumes como sendo “concretos”, isto é, questões inegociáveis, invariáveis, impossíveis de alteração, tal o apego afetivo às figuras que as representam, como: os pais, o clube de futebol, o partido político, a denominação religiosa, a teoria científica, etc.; 2) algumas pessoas podem se sentir “perfeitas”, tal o nível de zelo e exigências morais que tentam preencher e acreditam atendê-las, mais especialmente quando comparam e analisam as fraquezas alheias, o que as leva a elaborar críticas mordazes, estabelecer estruturas ideais onde tudo ocorre com perfeição, sem, contudo, perceber que nutrem um sentimento de inimizade contra todos aqueles que pensam diferentemente dele.

Posicionar-se desta maneira frente à vida é assumir uma atitude fatal. Como afirma outro analista junguiano: “A intensificação contínua da consciência para o ego e pelo ego causa cada vez mais escuridão e inconsciência em outros domínios. A consciência difusa de um território intermediário vai-se estreitando às especificações do ego, ou então acaba caindo no abismo. Perde-se a habilidade de enxergar na penumbra, ficando também perdido o senso de maravilhar-se, próprio da criança. Assim, a função simbólica entra em declínio e o mundo se torna desmitologizado” (HILLMAN, J. Uma busca interior em psicologia e religião. São Paulo: Paulinas: 1984, p. 123).

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