Árvores de Natal
confeccionadas de material reciclável em Bragança Paulista, na região de
Campinas, geraram discórdia entre os moradores, e já foram recolhidas para um
depósito da cidade (O Estado de São Paulo. 17.12.14, p. A21).
As opiniões
acerca da decoração natalina realizada pelo artista plástico Fábio Delduque,
revelam o nível do desentendimento entre os moradores. Para alguns:
“monstrengos de lixo”. Para outros, entretanto: “O erro é a posição geográfica.
Essa árvore de Natal deveria estar em Paris, Barcelona, talvez Amsterdã”.
A decoração
natalina é uma variável do mundo da arte, assim como a poesia, a música, a
pintura, a escultura, o cinema, a literatura, a fotografia, a arquitetura e outras
criações inovadoras da tecnologia e da ciência.
A decoração de
nossos lares, templos, hospitais, lojas e de nossas ruas, nesta e em outras
épocas do ano, revela o estado da nossa sensibilidade interior.
A arte expressa
simbolicamente o momento da cultura, a condição psíquica coletiva e pessoal, na
tentativa de compensar a unilateralidade da nossa consciência coletiva e
individual.
“Partindo da
insatisfação do presente, a ânsia do artista recua até encontrar no
inconsciente aquela imagem primordial adequada para compensar de modo mais
efetivo a carência e unilateralidade do espírito da época”, conforme C. G. Jung
(O espírito na arte e na ciência. Petrópolis: Vozes, 1985, p. 71).
A arte natalina
de Bragança Paulista traz à tona o estilo de vida que estamos preferindo
empreender: nossos hábitos ambientais apontam para um distanciamento de nossas condições
psicológicas; é como se estivéssemos desenraizados de nós mesmos. A discórdia
experimentada entre os bragantinos revela a forma agressiva com que nós estamos
nos relacionando com o planeta, como lidamos com o consumo e com o descarte do
lixo, o “lixo” como patologia entre o ser humano e a natureza.
A arte de
Delduque, como a de Vik Muniz, que trabalhou com os catadores de recicláveis da
Comunidade do Jardim Gramacho, junto ao maior aterro sanitário do mundo, em
Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, não é para nos levar a interpretar o seu
significado, mas sim, a ouvir ao que as imagens têm a nos dizer, querem de nós.
“Deixamos as
imagens emergirem, extasiando-nos talvez diante delas (ou rejeitando-as, como
fizeram os bragantinos), e com isto nos satisfazemos. Poupa-se, em geral, o
esforço de compreendê-las e o pior é que não se encaram as consequências éticas
que elas suscitam. [...] As imagens do inconsciente impõem sobre ao homem uma
pesada obrigação. Sua incompreensão, assim como a falta de sentido da
responsabilidade ética privam a existência de sua totalidade e conferem a
muitas vidas individuais um cunho de penosa fragmentação”, escreveu Jung
(Memórias, sonhos e reflexões. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p. 171).
A arte chama-nos
a participar do drama que o lixo quer nos comunicar, fazendo de cada um de nós
um artífice de suas soluções. Como diria Nietzsche: “A arte como a redenção do
que age – daquele que não somente vê o caráter terrível e problemático da
existência, mas o vive, quer vivê-lo, do guerreiro trágico, do herói” (O
nascimento da tragédia no espírito da música. Os Pensadores. São Paulo: 1987,
p. 28).
Feliz
Natal!
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