domingo, 14 de dezembro de 2014

Qual será a reação psicológica ao Relatório da Comissão Nacional da Verdade?

            A Comissão Nacional da Verdade (CNV), entregou seu Relatório Final, nesta última quarta-feira, 10 de dezembro, depois de 31 meses de intensos trabalhos. Os objetivos eram: apurar as violações aos direitos humanos, prisões sem base legal, tortura e mortes decorrentes, violências sexuais, execuções e ocultações de cadáveres; efetivar o direito à memória, à verdade histórica e promover a reconciliação nacional.
            O Relatório registra: 434 pessoas foram mortas ou desaparecidas durante os anos 1946-1988, período entre as duas últimas Constituições democráticas brasileiras; 210 pessoas continuam desaparecidas; 361 agentes do Estado praticaram violações de direitos humanos, no mesmo período; e, recomenda 29 medidas de continuidade das ações iniciadas pelo grupo de trabalho (O Estado de São Paulo. 11.12.14, p. A4).
            Este acontecimento histórico nacional produz sentidos novos, reforça ou rompe alguns antigos, mas principalmente, pode levar a ressignificação de posições nas relações de cada brasileiro nos campos político-sociais, ético-jurídicos, psicoculturais.
            É importante, neste contexto, manter um diálogo contínuo com as experiências psicológicas que este acontecimento provoca em nossas fantasias, pois são elas que expressam as mais puras e verdadeiras tendências de nossa personalidade, na maioria das vezes, não reconhecidas, por serem muito íntimas.
            Conforme C. G. Jung: “A psique cria diariamente a realidade. Só encontro uma expressão para designar essa atividade: a fantasia. A fantasia tanto é sentir como pensar, tanto é intuitiva como perceptiva. [...] Por isso a fantasia me parece ser a mais clara expressão da atividade psíquica específica. É, sobretudo, a atividade criadora que procura uma resposta para todas as indagações contestáveis, a mãe de todas as possibilidades, na qual se encontram vitalmente vinculados, como todos os extremos psicológicos, tanto no mundo interior como o exterior” (Tipos psicológicos. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1987, pp. 80-81).
            É recomendável, a esta altura da história da sociedade brasileira, que cada brasileiro aproveite o momento e considere adequadamente o que se passa em suas percepções psíquicas quanto ao que este Relatório da CNV toca em nossas fantasias.
Enquanto a consciência procura adaptar-se à vida como se nada tivesse acontecido, o inconsciente aguarda o momento mais propício - e nunca é tarde demais para rever e reaver a história - para revelar o que muitos buscavam esquecer ou que, simplesmente, fosse esquecido. Isto aconteceu, por que: “O inconsciente contém todas as combinações de fantasia que ainda não ultrapassaram o limiar de intensidade, mas que, com o decorrer do tempo e em circunstâncias favoráveis, entrarão no campo luminoso da consciência”, de acordo com Jung (A natureza da psique. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 1).
A psique busca autorregular-se aos acontecimentos externos, e vice-versa, diante das dificuldades. O que podemos gerar além de depressão, ressentimentos, ansiedade, medo, culpa, afetos extremados, como a violência?

Mais uma vez, as palavras de Jung podem contribuir para a nossa reflexão: “A psique não apenas reage, ela dá sua resposta própria às influências que atuam sobre ela” (Freud e psicanálise. Petrópolis: Vozes, 1989, p. 278).

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