A
Comissão Nacional da Verdade (CNV), entregou seu Relatório Final, nesta última
quarta-feira, 10 de dezembro, depois de 31 meses de intensos trabalhos. Os
objetivos eram: apurar as violações aos direitos humanos, prisões sem base
legal, tortura e mortes decorrentes, violências sexuais, execuções e ocultações
de cadáveres; efetivar o direito à memória, à verdade histórica e promover a
reconciliação nacional.
O
Relatório registra: 434 pessoas foram mortas ou desaparecidas durante os anos
1946-1988, período entre as duas últimas Constituições democráticas
brasileiras; 210 pessoas continuam desaparecidas; 361 agentes do Estado
praticaram violações de direitos humanos, no mesmo período; e, recomenda 29
medidas de continuidade das ações iniciadas pelo grupo de trabalho (O Estado de
São Paulo. 11.12.14, p. A4).
Este
acontecimento histórico nacional produz sentidos novos, reforça ou rompe alguns
antigos, mas principalmente, pode levar a ressignificação de posições nas
relações de cada brasileiro nos campos político-sociais, ético-jurídicos, psicoculturais.
É
importante, neste contexto, manter um diálogo contínuo com as experiências
psicológicas que este acontecimento provoca em nossas fantasias, pois são elas
que expressam as mais puras e verdadeiras tendências de nossa personalidade, na
maioria das vezes, não reconhecidas, por serem muito íntimas.
Conforme
C. G. Jung: “A psique cria diariamente a realidade. Só encontro uma expressão
para designar essa atividade: a fantasia. A fantasia tanto é sentir como
pensar, tanto é intuitiva como perceptiva. [...] Por isso a fantasia me parece
ser a mais clara expressão da atividade psíquica específica. É, sobretudo, a atividade
criadora que procura uma resposta para todas as indagações contestáveis, a mãe
de todas as possibilidades, na qual se encontram vitalmente vinculados, como
todos os extremos psicológicos, tanto no mundo interior como o exterior” (Tipos
psicológicos. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1987, pp. 80-81).
É
recomendável, a esta altura da história da sociedade brasileira, que cada
brasileiro aproveite o momento e considere adequadamente o que se passa em suas
percepções psíquicas quanto ao que este Relatório da CNV toca em nossas
fantasias.
Enquanto a
consciência procura adaptar-se à vida como se nada tivesse acontecido, o
inconsciente aguarda o momento mais propício - e nunca é tarde demais para
rever e reaver a história - para revelar o que muitos buscavam esquecer ou que,
simplesmente, fosse esquecido. Isto aconteceu, por que: “O inconsciente contém
todas as combinações de fantasia que ainda não ultrapassaram o limiar de
intensidade, mas que, com o decorrer do tempo e em circunstâncias favoráveis,
entrarão no campo luminoso da consciência”, de acordo com Jung (A natureza da
psique. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 1).
A psique busca
autorregular-se aos acontecimentos externos, e vice-versa, diante das
dificuldades. O que podemos gerar além de depressão, ressentimentos, ansiedade,
medo, culpa, afetos extremados, como a violência?
Mais uma vez, as
palavras de Jung podem contribuir para a nossa reflexão: “A psique não apenas
reage, ela dá sua resposta própria às influências que atuam sobre ela” (Freud e
psicanálise. Petrópolis: Vozes, 1989, p. 278).
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