segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A fascinação do álcool (2)


            O fascínio que as bebidas alcoólicas provocam em muitas pessoas, não poderia ser associado a sua imaturidade intelectual e emocional, tal como o encantamento que os brinquedos exercem sobre uma criança, e por isso a dificuldade de superação, apesar de tantos esforços?
De fato, é difícil deixar de algo que nos dá prazer, ajuda-nos a sentir coisas que não sentimos em outras situações, a esquecer de circunstâncias desagradáveis, a se considerar merecedor e receber a atenção de terceiros, a superar e nos proteger de incertezas ou dúvidas quanto a nós mesmos e/ou de outras pessoas, a sentir-se íntimo do mundo dos deuses e de uma alegria que contagia quem está por perto, como afirma a doutora em psicologia pela USP Gláusa Gláusa de Oliveira Munduruca, em sua tese “Contribuição para o estudo da constituição psíquica de mulheres alcoolistas”, citada no artigo anterior (30/10).
            Não é isto que se vê numa criança ao brincar? Ainda bebê, a criança é fascinada pelo mamilo, seio, rosto, boca e os cabelos da mãe; são seus primeiros brinquedos, caso contrário, não se integrariam. E, quando isto acontece pode estar ocorrendo algum grave distúrbio.
Com o passar do tempo a criança, contínua e rapidamente, desenvolve outras formas de brincar, adquirindo novas habilidades na tentativa de enfrentar a realidade ao seu redor. Para o pediatra e psicanalista inglês Donald Woods Winnicott (1896-1971), os brinquedos são elementos transicionais, isto é, contribuem na transição de uma fase de vida para outra, e aos poucos se tornam fatores que facilitam a capacidade de fantasiar, imaginar e pensar, portanto, que ajudam a enfrentar a realidade, e não para fugir dela.
Os brinquedos, dos mais simples aos mais sofisticados, são poderosos agentes de um mundo mágico. Basta imaginarmos para entrarmos no “mundo da lua”, nos tornarmos lunáticos (malucos). Na mente, a “mentirinha” adquire status da mais pura realidade. Meninas e meninos transferem para o mundo da fantasia toda a sua libido, por isso se desgostam tão facilmente quando chega o momento de voltar à realidade, como por exemplo, guardar os brinquedos e tomar banho.
Em “A criança como indivíduo”, o analista junguiano Michael Fordham (1905-1995) afirma: “Graças às reduzidas dimensões dos brinquedos, a criança tem – dentro dos limites impostos pela natureza do brinquedo – controle total sobre o brincar. Por isso há ampla margem para expressar e gozar valiosas sensações de onipotência, especialmente quando se trata do brincar criativo com os materiais primários (água, areia, argila), da pintura e do desenho” (São Paulo: Cultrix, 2006, p. 25).
Assim como bonecas e/ou “casinha” levam as crianças a acreditarem que são “mamães” e “papais”; “carrinhos” dão a sensação de que são habilidosos motoristas, capazes de manobras radicais; jogos eletrônicos que oferecem situações de perigo levam-nas a se sentirem invencíveis e indestrutíveis; dados, notas e moedas de jogos como o “Banco Mobiliário”, de que são pessoas ricas e bem sucedidas; garrafas, copos e taças cheias podem passar a ser os brinquedos dos que consomem bebidas alcoólicas, pois é comum ouvir de seus consumidores: “Tudo está sob controle, não se preocupe”; “Estou bem, nada me derruba”; ou, “Se quiser, eu posso parar a qualquer momento”.
Até onde vai a paranoia de que se pode beber álcool sem consequências?

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