domingo, 30 de outubro de 2011

A fascinação do álcool


            Há milênios, a humanidade tem convivido com a presença da bebida alcoólica. Esta sempre exerceu grande atração sobre os homens. Promete invencibilidade e felicidade perenes, fora dos padrões da realidade dura e complicada que muitas vezes nos metemos.
Alguns bebedores concluem que sem o álcool não conquistariam o que desejam, apesar de sofrerem as consequências. A peça publicitária de uma marca de cerveja deixa bem claro: os rapazes mergulham num mar tomado por tubarões e saem sem braços, pernas e cabeças. Não importa o prejuízo sofrido, contanto que bebam a cerveja.
            A venda e o consumo de bebida alcoólica têm como aliada a crença de que um mundo extraordinário existe paralelamente ao mundo dos seres humanos, “pobres mortais”. Exemplos não faltam: uma marca de bebida destilada quer nos fazer crer que um gigante de pedras acorda em plena baía da Guanabara; cervejas indicam que bebê-las nos farão ficar cercados de mulheres bonitas, ou que podemos pregar mentiras uns nos outros, sem consequências. E, cinicamente avisam: “se beber, não dirija”, como se eximindo do sofrimento que podem causar, e infelizmente, têm causado.
            A fascinação que as bebidas alcoólicas têm exercido sobre o gênero humano é muito semelhante à numinosidade que certas experiências nos causam, como por exemplo: quando amamos e somos amados, quando nos sentimos seguros e protegidos, e até mesmo, uma experiência mística. Por isso muitas pessoas se tornam dependentes, pois se busca que a primeira experiência se repita, indefinidamente, bastando o levantar dos copos, ainda que no primeiro momento provoque euforia, e mais tarde, depressão.
            Em resposta a uma carta do Sr. Willian G. Wilson, co-fundador do Grupo de Alcoólicos Anônimos, o psiquiatra Carl Gustav Jung (1875-1961) responde acerca de um dos seus pacientes e frequentador do A. A.: “A sua fixação pelo álcool era o equivalente, em nível mais baixo, da sede espiritual do nosso ser pela totalidade, expressa em linguagem medieval, pela união com Deus”.
            Gláusa de Oliveira Munduruca, doutora em psicologia pela USP, em sua tese “Contribuição para o estudo da constituição psíquica de mulheres alcoolistas”, afirma que o álcool: “Oferece uma gama de possibilidades ao consumidor: melhores condições de sensibilidade, amortecimento das preocupações e obtenção de prazer; liberação de recalques e manifestação no comportamento explícito de componentes das pulsões parciais como voyerismo-exibicionismo, sadismo-masoquismo e de componentes homossexuais; superação de sintomas como, por exemplo, fobias e/ou fomento de formações psíquicas paranóicas; experiências místicas de completude (Jung); e, sensações de euforia anestésicas, dependendo da quantidade ingerida e da resistência orgânica do sujeito” (São Paulo: 2008, p. 38).
Na opinião do psicólogo junguiano João Loch, da vizinha cidade de Garça, que atende dependentes químicos, o consumo de álcool é: “A busca por um estado de consciência alterado, que leva a pessoa a ter coragem para conquistar coisas ou estados de espírito, graças a uma imagem distorcida que tem de si mesmo. Por não saber lidar com o estresse ou com alguma frustração, toma como alternativa consumir bebidas”.
Apesar de difícil tratamento, o alcoolista e sua família precisam ser ajudados.

Um comentário:

  1. Bacana seu texto, Silvio.

    A propósito, já vi em alguma página na internet um trecho dessa carta que Jung escreveu ao co-fundador do AA, afirmando que ácool é uma palavra que deriva de outra palavra latina, a qual, por sua vez, significa espírito. Gostaria de confirmar isso, pois nunca vi nenhuma outra referência a respeito. Pode me ajudar?

    Abraço,
    Thalita.

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