domingo, 10 de junho de 2012

Inconsciente: fonte de todas as tecnologias


            Tal como o lenhador, de Jorge Luis Borges (1899-1986), acreditamos que “no bosque há lobos, mas os lobos não me amedrontam e meu machado nunca me foi infiel”, e amparados no acordo com os irmãos “mais velhos” podemos derrubar “todo o bosque até não restar uma única árvore” (O livro de areia. São Paulo: MEDIAfashion, 2012, pp. 91-93). E, assim nos dispomos a matar todo aquele que tenta nos impedir de possuir o que lhe pertence, ainda que depois do crime não encontremos mais o que tanto ambicionamos, e sem consciência do mal que nos possui.
            É com esta sociedade de “lenhadores” que a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – a Rio+20 – que ocorrerá de 13 a 22/06, na cidade do Rio de Janeiro, estará lidando.
A terra clama de todos os pontos cardiais que ninguém é inocente, mas que a sombra sobre os mares, rios, cidades, florestas e as espécies, tem a forma humana. Mas, cuidado. Esta situação não é para estimular a aversão a nós mesmos. A misantropia pode fortalecer os discursos das indústrias e das agências financeiras mundiais, ávidas por sufocar as boas intenções de proteção e preservação do meio ambiente, e vender seus produtos. A aversão ao ser humano, devido à maldade inerente a nossa natureza, gera a cultura da depressão, ou seja, de como é impossível corrigir nossas atividades exterminadoras, temos de nos conformar a ela, e continuar sob a luz bruxuleante do fracasso, e ao culto da idealização da natureza.
            O “machado” simboliza a tecnologia e seus avanços sobre a nossa alma, alterando, para sempre, a paisagem e nós mesmos. Adaptados às técnicas, as consideramos partes da natureza, e não mais produtos de nossas mentes e mãos, na opinião do psicólogo junguiano Andrew Samuels (A psique política. Rio de Janeiro: Imago Ed., 1995).
Para Roger Bastide (1898-1974), a crença na tecnologia se fortalece à medida que a razão humana ofusca a importância dos mitos, e toma o seu lugar. Para ele: “Entre as coisas e os homens, um novo corpo, intermediário se substituiu ao antigo, composto de cidades de cimento e ferro, de usinas fechadas, de máquinas de viver, de comer, de dormir, de fazer amor. As fumaças escondem o céu, o ar e água se emporcalham com nossos dejetos, os postes elétricos tomam o lugar de árvores vivas, as paisagens já não passam de cartazes de propaganda, as lâmpadas de neon apagaram as estrelas, e nós nos agitamos numa floresta de correias de transmissão, engrenagens giratórias, bielas e bate-estacas” (Roger Bastide. O sagrado selvagem e outros ensaios. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 105).
            Se do inconsciente vieram os “machados” que nos machucam e nos matam, dele também vêm ideias e medidas que facilitam o desenvolvimento sustentável do planeta. Cada ser humano é capaz de reconhecer o que é essencial, o que é prioritário e o que tem valor perene para si e para as futuras gerações.
É preciso considerar que é o consumismo egocêntrico que fundamenta a ordem social e moral de nossos tempos, e que quanto mais intransigentes forem nossas percepções neste campo, maiores serão as exigências a uma mudança de posicionamento frente às demandas da natureza que nos impõem limites cada vez menores às nossas ambições.

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