domingo, 15 de março de 2015

Esta cidade sou eu
                   Nossas cidades falam de nós e para nós. Quer dizer, a vida urbana revela aquilo que somos e nos apresenta a nós mesmos, sem escamotear a nada. Assim como o nosso corpo em gestos e gostos ressaltam nossas características pessoais, nossas cidades apresentam as questões humanas, a visão de mundo do homem. Se você não olha para a cidade, você não se reconhece nela. E, olhar para a cidade significa enxergar-se nela. Como a música: “A cor dessa cidade sou eu, o canto dessa cidade é meu”, de Daniela Mercury (O canto da cidade).
                   Nossas ruas e avenidas, vilas e bairros, praças e construções são testemunhas de nossos desejos, desavenças, medos, inflações, separações, alegrias, fantasias, mitos, rituais, energias, iniciativas, loucuras, dilemas, dramas, sonhos, dissociações, frustrações, limites, amizades, paradoxos, impulsos e mortes.
                   O psíquico misterioso está plasmado no concreto visível. A dimensão subjetiva, nossas sensibilidades participam ativamente no processo que estabelecemos na vida urbana. O inconsciente integra a vida consciente que levamos na cidade. “Tropeçamos” em nós mesmos nos buracos das vias públicas, nos edifícios, nas construções e viadutos.
                   “O homem está na cidade/ como uma coisa está em outra/ e a cidade está no homem/ que está em outra cidade”, conforme o poeta Ferreira Gullar (1930-), em seu “Poema Sujo. Velocidades”. Ou, como afirma o psicólogo James Hillman (1926-2011): “Não apenas a minha patologia se projeta sobre o mundo; o mundo está me inundando com o seu sofrimento que não se alivia” (Cidade e alma. São Paulo: Studio Nobel, 1993, p. 13).
                   Isto desafia nossa criatividade. Quer dizer, precisamos encontrar outros caminhos e outras perspectivas acerca de nós mesmos. Para isso temos de nos aproximar uns dos outros, respeitar as nossas diferenças, re-significar valores pessoais, experimentar ideias diferentes, aprender a interpretar a linguagem da alma, compreender a fala da “anima mundi”, isto é, sintonizar-se aos pensamentos que movimentam o coletivo que visam o bem de todos e abrir mão de interesses particulares.
                   “Cidades instigam negócios criativos quando reúnem pessoas dinâmicas, inspiram comportamentos inovadores, atraem talentos e combinam capital e educação”, segundo Richard Florida (Revista Época. São Paulo: Edição 873, 2015, p. 72).
                   Milhões de pessoas em várias cidades do mundo, inclusive no Brasil, passam por esta experiência. Muito mais de saberem aproveitar as oportunidades, é preciso valer-se de fatores psíquicos que todas as cidades têm a sua disposição, aspectos inconscientes se conscientizados, os habitantes desenvolvem os seus potenciais humanos.
                   Só assim para descobrirmos um tesouro de ideias e de forças criativas, percebermo-nos solidários com toda a humanidade, tal como ela sempre foi e sempre será, segundo o pensamento da psicologia analítica de C. G. Jung (A prática da psicoterapia. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 33).
(Sílvio Lopes Peres – Psicólogo Clínico – CRP 06/109971 – Fones: 998051090 / 981378535 – http://psijung.blogspot.com.br)

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