quarta-feira, 8 de junho de 2011

PACIENTES RENAIS CRÔNICOS: PRINCIPAIS EMOÇÕES VIVENVIADAS


PACIENTES RENAIS CRÔNICOS: PRINCIPAIS EMOÇÕES VIVENVIADAS
PERES, Sílvio Lopes[1]
FONSECA, Bárbara Cristina Rodrigues[2]


RESUMO

A insuficiência renal crônica caracteriza-se como o estágio terminal do funcionamento dos rins. Alguns estudos demonstram que, as pessoas acometidas desta enfermidade apresentam uma importante alteração na sua saúde mental. O presente artigo se propõe a apresentar as principais emoções psicológicas vivenciadas pelos pacientes que passam pelos diversos tipos de tratamentos renais disponíveis na atualidade. Os dados encontrados apontam que estes pacientes vivenciam emoções muito diferenciadas: fantasia, culpa, ansiedade, rejeição, tristeza, decepção, engano, desesperança, medo (inclusive de morrer), baixa estima, ódio, dependência, angústia, depressão, agressividade, diminuição do interesse ou prazer nas atividades habituais, autopiedade, irritabilidade, nojo e isolamento. A literatura também salienta o papel do psicólogo como essencial enquanto profissional da saúde junto aos pacientes renais crônicos, possibilitando-os a lidar com suas emoções e melhorando seu bem-estar e sua qualidade de vida.
           
PALAVRAS-CHAVE: Doença Renal Crônica. Distúrbios Psicológicos Sofridos por Pacientes Renais Crônicos. Assistência Psicológica a Pacientes Renais Crônicos.

ABSTRAT

Chronic renal failure is characterized as the end stage of kidney function. Some studies show that this disease affected individuals have an important influence on their mental health. This article aims to present the main psychological emotions experienced by patients undergoing the various types of renal treatments available today. The findings show that these patients experience very different emotions: fantasy, guilt, anxiety, denial, sadness, disappointment, deception, despair, fear (including death), low self-esteem, anger, addiction, anxiety, depression, aggressiveness, decreased interest or pleasure in usual activities, self-pity, irritability, anger and isolation. The literature also highlights the role of psychologists as essential as a health professional with patients with chronic renal failure, enabling them to deal with their emotions and improve their well-being and quality of life.

KEY WORDS: Chronic Kidney Disease. Psychological Disorders Conceded by Chronic Kidney Patients. Psychological Care in Chronic Kidney Patients.


  1. INTRODUÇÃO
A doença renal crônica, segundo Romão (2004) é o estágio terminal do funcionamento dos rins. Trata-se da perda irreversível das funções renais, quando os sintomas físicos são mais aparentes, a qualidade de vida do paciente é bastante prejudicada, havendo, portanto, necessidade de se adotar algum tratamento que visa a depuração artificial do sangue, seja em diálise peritoneal ou hemodiálise; ou o transplante renal, propriamente dito.
Conforme Alvarez et al (2009) e Oliveira (2003), as pessoas acometidas por esta enfermidade apresentam uma importante alteração na saúde mental, experienciando diferentes emoções no transcorrer do tratamento da enfermidade.
Apesar da diminuíção da taxa de mortalidade destes pacientes e da sensível melhora do tratamento substitutivo da função renal nos últimos anos, ainda é muito grande o risco de suicídio devido aos transtornos de ansiedade e depressão (PÁEZ et al, 2009).
Este estudo, produto de uma pesquisa bibliográfica, se propõe a apresentar as principais emoções psicológicas vivenciadas pelos pacientes que passam pelos diversos tipos de tratamento renal disponíveis na atualidade.
No fichamento das obras pesquisadas, foram encontrados poucos trabalhos acadêmicos do campo da Psicologia quanto ao problema em questão, sendo mais comuns trabalhos ligados às áreas da enfermagem e médica. Trata-se, portanto, de um assunto de interesse de todos os profissionais da área da saúde.

  1. TERAPIAS RENAIS SUBSTITUTIVAS (TRS) DISPONÍVEIS NA ATUALIDADE
Quando a doença renal crônica (DRC) é diagnosticada, são disponibilizadas ao paciente as seguintes Terapias Renais Substitutivas (TRS): transplante, hemodiálise e diálise peritoneal. A preferência do paciente é o determinante mais importante da escolha pela modalidade, especialmente se o paciente não tiver nenhuma contraindicação prévia (HYPHANTIS; SPIROS; VOUCICLARI, 2010).

2.1.        Transplante Renal
Segundo Cesarino e Casagrande (1998) e Higa et al (2008): o transplante renal é o “tratamento mais natural de substituição para os rins frente à doença renal crônica, e que pode trazer de volta a qualidade e estilo de vida anterial à manifestação da doença”. Os pacientes que se submetem a este procedimento, na maioria das vezes passam antes pela hemodiálise ou diálise peritoneal (QUINTANA e MULLER, 2006).
É recorrente, segundo Quintana e Muller (2006), que o receptor apresente as seguintes emoções psicológicas: fantasias de adquirir as características físicas e comportamentais de seu doador ou de que este venha a ter problemas devido à falta do rim doado, caso receba o órgão de um cadáver, pode sentir-se culpado pelo fato de depender da morte de uma pessoa para conseguir um rim; ansiedade quanto aos papéis sociais, seja na família, no trabalho ou na sociedade em geral; em caso de rejeição do órgão, sente-se frustrado, passa por tristezas e decepções.

2.2.        Hemodiálise
A hemodiálise é um tratamento inevitável e intermitente realizado no hospital ou em clínicas, com o auxílio de uma máquina, que remove as substâncias tóxicas e o excesso de líquido acumulado no sangue e tecidos do corpo em consequência da falência renal, durante três ou quatro horas, ao menos três vezes por semana, podendo variar este período conforme o peso e a idade do paciente (OLIVEIRA, 2003; KOEPE E ARAUJO (2008).
Este tratamento, na maioria das vezes, gera frustração, engano e desesperança, devido à manutenção de uma dieta específica associada às restrições hídricas e à modificação do cateter para o acesso vascular ou da fístula arteriovenosa (REIS, GUIRARDELLO E CAMPOS, 2008; DeFELIPE, 2009; OLIVEIRA, 2003).
Segundo Reis, Guirardello e Campos (2008), DeFelipe (2009), Oliveira (2003), Alvarez (2009) e Páez et al (2009), a frustração é vivenciada pelo adiamento de planos, e poucas expectativas de vida saudável futura.
A falta de lazer e a incapacidade para o trabalho pode provocar uma diminuição da autoestima dos indivíduos, pois passam a se sentirem dependentes financeiramente e incapazes de manter a família, transferindo esta responsabilidade para outra pessoa (OLIVEIRA, 2003; CRUZ E ARAUJO, 2008).
A hemodiálise suscita sentimentos ambíguos de amor e ódio, pois ao mesmo tempo em que garante a sobrevivência, torna a pessoa dependente de uma máquina (KOEPE E ARAUJO, 2008; ALVAREZ, 2009; DeFELIPE, 2009). Alguns pacientes, segundo Anger (1975, apud Cesarino e Casagrande, 1998), relatam se sentirem como “homens semi-artificiais”, devido ao uso da máquina.
O medo da morte, também é uma emoção frequente destes pacientes, experimentando fantasias de angústia, porque o assunto morte é, normalmente, tratado como “tabu”, pela equipe médica e de enfermagem: “quando algum paciente falecia, o movimento da equipe era de silêncio e agia-se como se nada tivesse acontecido; os sentimentos e as falas ficavam velados” (RESENDE et al, 2007).
Também é comum o paciente sentir depressão apoiada simultaneamente numa agressividade intensa ou em reações de luto (Diniz, 2002 apud Quintana e Müller, 2006); ansiedade, diminuição do interesse ou prazer em suas atividades habituais, irritabilidade, deterioração familiar, disfunção sexual e negação da doença; autopiedade, devido à superproteção que recebe dos seus familiares, tornando-o dependente e infantilizado, provocando a perda da sua própria identidade como pessoa ou indivíduo (ALVAREZ, 2008; HIGA et al , 2009; RODRIGUES & BOTTI, 2009).
De acordo com Quintana e Müller (2006), os pacientes apresentam sentir “nojo” quando conectados à máquina. A dependência que o paciente passa a sentir da máquina, da equipe de atendimento, do hospital ou da clínica onde o tratamento é realizado pode gerar um sentimento de total inferioridade, que pode levar a uma atitude de rebeldia por sentir-se mais dependente (DeFELIPE, 2009).
 Conforme Hyphantis, Spiros e Voudiclari (2010) pacientes que usam um mecanismo de defesa passivo-agressivo procuram pela hemodiálise, e apresentam agressão para com os outros “possivelmente através da passividade, masoquismo e, voltando-se contra si mesmos”.
Quanto à fístula artério-venosa – acesso permanente, criado por meio cirúrgico ao se unir uma artéria em uma veia – esta compromete a autoimagem dos pacientes, podendo causar sofrimentos que na maioria das vezes não são verbalizados. (KOEPE e ARAUJO, 2008).

2.3.        Diálise Peritoneal
Trata-se de um procedimento cirúrgico para a introdução de um cateter na região abdominal, pelo qual ocorre a eliminação das substâncias tóxicas do organismo com a ajuda de uma solução dialisadora, realizada por meio de uma membrana semipermeável natural, o peritônio.
Os pacientes em diálise peritoneal convivem com o medo relacionado à higiene do processo da troca das bolsas que contém a solução dialítica, devido aos riscos com infecções bacterianas (QUINTANA e MÜLLER, 2006).

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Segundo a American Psychiatric Association (1994, apud Páez et al, 2009), “as doenças que comportam um maior risco suicida são as enfermidades crônicas, incuráveis e dolorosas (...) como a insuficiência renal crônica”.
Este artigo se propôs a apresentar as principais emoções psicológicas vivenciadas pelos pacientes que passam pelos diversos tipos de tratamento renal disponíveis na atualidade.
Segundo os autores pesquisados, as pessoas acometidas desta enfermidade apresentam uma importante alteração na saúde mental, vivenciando emoções muito diferenciadas: frustração, engano, desesperança (REIS, GUIRARDELLO e CAMPOS, 2008; DeFELIPE, 2009; OLIVEIRA, 2003), sentimentos ambíguos como o amor e o ódio (KOEPE e ARAUJO, 2008; ALVAREZ, 2009; DeFELIPE, 2009), medo da morte (RESENDE et al, 2007), depressão e agressividade intensa (DINIZ, 2002 apud QUINTANA e MULLER, 2006); ansiedade, diminuição do interesse ou prazer nas atividades habituais, irritabilidade, autopiedade, dependência, infantilização e perda da identidade (ALVAREZ, 2008; HIGA et al , 2009; RODRIGUES & BOTTI, 2009), nojo de si mesmo (QUINTANA e MULLER, 2006), isolamento, não aceitação de si mesmo e temor de não se sentir aceito, dependência da máquina, sentimento de inferioridade e rebeldia (DeFELIPE, 2009), passividade e masoquismo (HYPHANTIS, SPIROS e VOUDICLARI, 2010), ansiedade quanto aos papéis sociais , fantasias de adquirir as características físicas e comportamentais de seu doador, culpa pela dependência de outras pessoas, rejeição, tristezas e decepções (QUINTANA e MULLER, 2006); comprometimento da autonomia e estresse contínuo (GARCIA E ZIMMERMAN, 2006). Em muitos pacientes, outras emoções, como coragem, também podem ser sentidas (ALVAREZ et al, 2009).
O psicólogo, como profissional da saúde, tem um papel essencial junto aos pacientes renais crônicos, ajudando-os a melhorar seu bem-estar e sua qualidade de vida. Percebe-se que a relação terapêutica contínua com o psicólogo é de grande valor, pois proporciona ao paciente, formas para a expressão de seus sentimentos, medos e angústias (SILVA et al, 1993).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVAREZ, M. P. S. et al. Estudio de los estilos de apego adulto en un grupo de pacientes con insuficiência renal crónica terminal. Universidade Psychol. Vol. 8, nº 2, Bogotá, Colômbia, 2009. Disponível em: http://www.scielo.unal.edu.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1657-92672009000200009&lng=en&nrm=iso>. ISSN 1657-9267.

CESARINO, C. B. e CASAGRANDE, L. D. R. Paciente com insuficiência renal crônica em tratamento hemodialítico: atividade educativa do enfermeiro. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v6n4/13873.pdf. Acesso em: 04 jan. 2011.

CRUZ, D.O.A; ARAUJO, S.T.C. Diálise peritoneal: a percepção tátil do cliente na convivência com o cateter. Acta Paul Enferm. 2008; 21(Spe):164-8.

DeFELIPE, V. Intervención grupal em um servicio de hemodiálisis. Guadalajara, México, 2009. Disponível em: http://www.area3.org.es/htmlsite/productdetails.asp?id =19. Acesso em: 04 jan. 2011.

GARCIA, C. J. & ZIMMERMANN, P.R. Falência e Transplante de órgãos. In N. J. Botega. Prática Psiquiátrica no hospital geral: interconsulta e emergência. Porto Alegre: Artmed, 2006.

HIGA, K. et al. Qualidade de vida de pacientes portadores de insuficiência renal crônica em tratamento de hemodiálise. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ape/v21nspe/a12v21ns.pdf. Acesso em: 05  jan. 2011.

HYPHANTIS, T. SPIROS, K. VOUDICLARI, S. Ego mechanisms of defense are associated with patients’ preference of treatment modality independent of psychological distress in end-stage renal disease. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2846137/. Acesso em: 04 jan. 2011.

KOEPE, G. B. O. e ARAÚJO, S. T. C. A percepção do cliente em hemodiálise frente à fístula artério venosa em seu corpo. Acta paul. enferm.,  São Paulo,  v. 21,  n. spe,   2008 .   Disponível em:  <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-21002008000500002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 05  Jan.  2011. 

OLIVEIRA, I. R. Hemodiálise: da máquina... dos limites... do desejo. Associação Doe Vida. Itabira, MG, 2003.

PÁEZ, A. E. et al. Ansiedad y depression en pacientes con insuficiencia renal crônica em tratamiento de diálisis. Universidad Psychol. Vol. 8, nº 1, Bogotá, Colômbia, 2009.

QUINTANA, A. M. e MÜLLER, A. C. Da saúde à doença: representações sociais sobre a insuficiência renal crônica e o transplante renal. Disponível em: http://www2.pucpr.br/reol/index.php/PA?dd1=140&dd99=view. Acesso em: 05 jan. 2011.

REIS, C. K.; GUIRARDELLO, E. B. e CAMPOS, C. J. G. O indivíduo renal crônico e as demandas de atenção. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/reben/v61n3/a10v61n3.pdf. Acesso em: 05 jan. 2011.

RESENDE, M. C. et al. Atendimento psicológico a pacientes com insuficiência renal crônica: em busca de ajustamento psicológico. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/pc/v19n2/a07v19n2.pdf. Acesso em 06 jan. 2011.

RODRIGUES, T. A. e BOTTI, N. C. L. Cuidar e o seu cuidado na hemodiálise. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ape/v22nspe1/15.pdf. Acesso em 05 jan. 2011.

ROMÃO JÚNIOR, J. E. Doença Renal Crônica: definição, epidemiologia e classificação. J. Bras. Nefrol. Vol. XXVI, nº 3, supl. 1, agosto de 2004. Disponível em:  http://www.transdoreso.org/pdf/doenca_renal.pdf.  Acesso em 11 mar. 2011.

SILVA, C. A., Krollmann, M.A.O. & Miranda, E.M.F. Perfil psicológico do paciente renal crônico. Jornal Brasileiro de Nefrologia. 15 (3), 1993, p. 85 - 91.


[1] Teólogo, Pedagogo, Mestre em Ciências da Religião, Especialista em Docência do Ensino Superior e Acadêmico do Curso de Psicologia – FASU/ACEG – e-mail: silviosilvia@ig.com.br
[2]  Pedagoga, Orientadora Educacional, Psicóloga Clínica, Mestranda no Curso de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem. Docente do Curso de Psicologia – FASU/ACEG – e-mail: babi2121@hotmail.com

Um comentário:

  1. Gostei do artigo, pois estou estudando este tema na matéria: Psicoterapia para pacientes especiais. Obrigada!

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