segunda-feira, 30 de maio de 2011

Medo (III)

            O medo pode assumir algumas dimensões em nossas vidas.
            Para a doutora em filosofia e psicóloga junguiana Vera Kast (1943-), se eu desejo muito possuir uma coisa, posso desenvolver o medo de perdê-la, caso venha a possuí-la, como também, posso passar a me sentir incapacitado para qualquer outro objetivo na vida. Kast acredita que a vontade de ter e a vontade de poder “podem ser vistas como uma defesa contra a transitoriedade”, inerente à vida e às coisas que tanto quero (A ansiedade. São Paulo: Paulus, 2006, p. 31).
            Sem a noção de que a vida é transitória e tudo que venha a possuir também é não-permanente, me agarro ao que tenho, desejando possuir outras, somente para abafar o sentimento de finitude da minha própria vida e das coisas que, porventura, tanto quero. Sem a noção do lado efêmero da vida, é quase inexistente a noção de perigo, ou pelo menos esta fica bastante limitada. Agindo dessa maneira, me fecho às novidades, apesar de querer tanto possuir as coisas; e, toda vez que me lanço a alcançá-las, fico vulnerável a situações de risco, simplesmente por falta de modéstia e total ingenuidade. E isto limita a capacidade de enxergar outras possibilidades para um problema, impedindo assim a criatividade, incapacitando-me para novas experiências, que podem me levar a uma vida mais madura.
            Além disso, se esta emoção for analisada por outra dimensão, conforme Cláudio Cardoso de Paiva, professor do Departamento de Comunicação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o medo pode ser “desarmado por meio da astúcia, humor, ironia, sagacidade”, e não através de uma atitude corajosa ou valente, conforme o pensamento dominante (Muito além do jardim do bem e do mal: um ensaio sobre o medo, a mídia e a cidade - http://www.bocc.ubi.pt/pag/paiva-claudio-medo-midia-cidade.pdf).
            A valentia é mais apropriada para se possuir o que se deseja. Para amenizar o medo, Kast opina ser necessário compartilhar com o maior número de pessoas possível, do que manter sob o manto da solidão silenciosa, na tentativa de se proteger. Ao dividir com outras pessoas, é possível se sentir mais aliviado, pois se está aberto para ajuda que se pode receber, ainda que a ajuda propriamente dita não se concretize; enquanto isso, se ganha tempo para enfrentar mais fortalecido a sensação de fracasso que às vezes se avizinha. É acolher a vida, e não rejeitá-la, e deixar-se ser conduzido para uma situação aparentemente nova, que na verdade, se encontra num nível mais profundo, segundo o psiquiatra suíço Heinrich Karl Fierz (1912-1974), em seu “Psiquiatria junguiana” (São Paulo: Paulus, 1997).
Nestas ocasiões, é bom aproveitar para “reunir suas próprias possibilidades e trabalhar consigo mesmo” (Kast, p. 99), pois o medo também se impõe como mais uma oportunidade para desenvolver-se como pessoa, e não apenas sair da situação em que se encontra. Volte-se para os sonhos, para alguma ideia que apareça, mesmo que a considere desprezível, pois nela pode estar a saída do drama vivido. De onde menos se espera pode vir a segurança tão buscada como afirma Eva Broch Perrakos: “No sentimento de medo está a sua segurança”, em seu poema “No Sentimento” citado por Barbara Ann Brennan, em seu livro "Luz Emergente" (São Paulo: Cultrix/Pensamento, 2006, p. 231).

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